Na segunda semana da Quaresma, Francisco propõe três pontos de reflexão: o convite à conversão, o perdão de Deus e a armadilha da hipocrisia
Da Redação, com Rádio Vaticano
Quando a pessoa aprende a fazer o bem, Deus perdoa generosamente todo pecado. O que não perdoa é a hipocrisia, a “falsa santidade”. Essa foi a reflexão proposta pelo Papa Francisco, na Missa desta terça-feira, 3, na Casa Santa Marta, segunda semana da Quaresma.
Francisco colocou duas categorias de pessoas no centro de sua meditação: os santos fingidos, que mesmo diante do céu se preocupam em parecer mais do que ser, e os pecadores santificados, que apesar do mal feito aprenderam a fazer um bem maior. Nunca houve dúvida sobre quem Deus prefere, afirmou o Papa.
As palavras da leitura de Isaías são, segundo Francisco, um imperativo e, paralelamente, um convite que vem diretamente de Deus: “Deixai de fazer o mal! Aprendei a fazer o bem!”, defendendo órfãos e viúvas. Francisco acrescentou ainda a necessidade de defender aqueles que ninguém recorda, como os idosos abandonados, as crianças que não vão à escola e os que não sabem fazer o sinal da cruz. Por trás do imperativo, está o convite de sempre à conversão.
“Como posso me converter? ‘Aprendei a fazer o bem!’. A sujeira do coração não é removida como se remove uma mancha: vamos à lavanderia e saímos limpos. Remove-se com o ‘fazer': fazer um caminho diferente, outro caminho que não o do mal”.
Para fazer o bem, o Pontífice indicou várias opções simples, contidas nas próprias palavras de Isaías: procurar a justiça, socorrer o oprimido, fazer justiça ao órfão e defender a causa da viúva. Ou seja, ir para onde estão as chagas da humanidade, onde há dor. E a promessa de um coração lavado, isso é, perdoado, vem do próprio Deus, que não leva em conta os pecados daqueles que amam concretamente o próximo.
“Se você faz isso, se você segue por este caminho, no caminho ao qual eu te envio – diz-nos o Senhor –, mesmo se os vossos pecados fossem como púrpura, se tornariam brancos como neve’. É um exagero, o Senhor exagera, mas é a verdade! O Senhor nos dá o dom do seu perdão. O Senhor perdoa generosamente. (…) Mas se você quer ser perdoado, deve começar o caminho do fazer o bem”.
Sobre o Evangelho do dia, Francisco comentou a figura daqueles que dizem as coisas certas, mas fazem o contrário. Trata-se do caminho da hipocrisia. Essas pessoas, segundo o Papa, fingem se converter, mas seu coração é uma mentira, não pertence a Deus, e sim ao pai de todas as mentiras: satanás. Essa é uma falsa santidade, acrescentou o Papa.
“Mil vezes Jesus preferia os pecadores a esses. Por quê? Os pecadores diziam a verdade sobre si mesmos. ‘Afasta-te de mim, Senhor, que sou um pecador!': disse Pedro uma vez. Uma dessas pessoas nunca diz isso! ‘Agradeço-te, Senhor, porque não sou um pecador, sou um justo’… Na segunda semana da Quaresma, há essas três palavras para pensar: o convite à conversão, o dom que nos dará o Senhor – o perdão – e a armadilha, isto é, fingir se converter, mas adotar o caminho da hipocrisia”.A primeira imitação da santificação é a virtude moral
Ser justo, temperante, de bom comportamento, não ter a fama manchada com um escândalo vergonhoso é bom, mas não é o suficiente, não é santificação. Um campo florido é diferente de um jardim. Pagãos se apegaram à moralidade, como Catão, Sócrates e Aristides.90 A boa educação é somente uma natureza refinada, não há nada de Cristo nela, o coração pode ser impuro e abominável. Debaixo dessas folhas de boa educação, o verme da descrença pode estar escondido. Uma pessoa virtuosa tem uma antipatia secreta contra a graça, odeia o vício e também a graça tanto quanto o vício. A serpente tem uma bela cor, mas pica. Uma pessoa enfeitada e alimentada com uma virtude moral pode ter um afeto secreto contra a santidade. Os estóicos, que eram os principais pagãos moralistas, foram os inimigos implacáveis de Paulo (At 17.18).
b. A segunda imitação da santificação é a devoção supersticiosa
Isso é abundante no papado. As adorações, as imagens, os altares, as vestimentas e a água benta, coisas que eu entendo como frenesi religioso, e que estão longe da santificação. Nada disso acrescenta nenhum bem intrínseco ao homem, não faz o homem melhor. Se as purificações e as lavagens da lei, que eram orientações do próprio Deus, não fizeram daqueles que as praticaram mais santos, e os sacerdotes que vestiram vestimentas santas e tiveram óleo derramado sobre si só eram santos com a unção do Espírito, então, certamente, as inovações supersticiosas na religião, que Deus nunca orientou, não podem contribuir para qualquer santidade dos homens. Uma santidade supersticiosa não custa muito, não há nada do coração nela. Se santidade fosse dizer orações com uso de um rosário, curvar-se diante de uma imagem, benzer-se com água benta, e tudo aquilo que é requerido daqueles que crêem nessas coisas para salvação, então o inferno estaria vazio, ninguém entraria lá.
c. A terceira imitação da santificação é a hipocrisia
Hipocrisia é fingir uma santidade que se não tem. Assim como um cometa pode brilhar e se parecer com uma estrela ou como um lustre pode brilhar em seu lugar a tal ponto de ofuscar os olhos dos que o contemplam. "Tendo forma de piedade, negando-lhe, entretanto, o poder" (2Tm 3.5). São lâmpadas sem óleo, sepulcros caiados como os templos egípcios que eram bonitos do lado de fora, mas dentro havia todo tipo de podridão. O apóstolo fala da santidade verdadeira em Efésios 4.24, implicando que há uma santidade que é espúria e fingida. "Tens nome de que vives e estás morto" (Ap 3.1), são como quadros e estátuas destituídas de um princípio vital: "Nuvens sem água" (Jd 12). Fingem estar cheios do Espírito, mas são nuvens vazias. Isso mostra a santificação como uma auto-alucinação. Quem pega o cobre no lugar do ouro engana a si mesmo. Os santos mais falsos enganam os outros enquanto vivem, mas enganam a si mesmos quando morrem. Fingir a santidade quando não há nenhuma é uma coisa vã. Que vantagens levaram as virgens néscias que tinham lâmpadas fulgurantes quando precisaram de azeite? Qual é a utilidade de uma lâmpada sem o azeite da graça salvadora? Que consolo uma demonstração de santidade trará no final? Será que algo pintado com a cor de ouro pode enriquecer? A pintura de água pode refrescar aquele que está com sede? Ou a santidade imaginária será um sofrimento na hora da morte? Não se deve acomodar com uma pretensa santificação. Muitos navios que tinham o nome de Esperança, Triunfo e Vigilante foram lançados contra as rochas, assim, muitos que tiveram o nome de santos foram lançados no inferno.
d. A quarta imitação da santificação é a graça suprimida
Isso acontece quando os homens se abstêm do vício, embora não o odeiem. O lema de um pecador pode ser assim: "Eu estaria disposto, mas não tenho coragem". O cão só pensa no osso, mas tem medo do bastão, assim os homens têm a mente para a luxúria, mas suas consciências se posicionam como aquele anjo com uma espada flamejante e, assim, ela os amedronta: eles têm a mente para a vingança, mas o medo do inferno é como um freio de cavalo que os adverte. Não há mudança de coração, o pecado é freado, mas não exterminado. Um leão pode estar enjaulado, mas ainda é um leão.
e. A quinta falsificação da santificação é a graça comum
É uma obra tênue e passageira do Espírito, mas que não ajuda na conversão. Há um pouco de luz em um julgamento, mas não o é para a humilhação pessoal. Alguns têm peso na consciência, mas não acordam.
Parece santificação, mas não é. Os homens têm as convicções formadas neles, mas abrem mão dessa convicção, como o animal que, ao ser flechado, livra-se da flecha. Depois da convicção, os homens vão à casa da alegria, pegam a harpa para expulsar o espírito de tristeza e tudo morre e não se chega a nada.Em homilia o Santo Padre disse que, se aprendemos a fazer o bem, Deus perdoa de forma generosa todo pecado. O que ele não perdoa é a hipocrisia, “a santidade aparente”.
O Papa afirmou ainda que os santos aparentes se preocupam mais em parecer mais do que ser realmente santos, mesmo diante do céu. Já os pecadores santificados aprenderam a fazer um bem maior, algo que vai além do mal praticado.
“As palavras da leitura de Isaías são um imperativo e paralelamente um convite que vem diretamente de Deus: ‘Parem de fazer o mal, aprendam a fazer o bem’ defendendo órfãos e viúvas, ou seja aqueles que ninguém recorda, entre os quais há também os idosos abandonados, as crianças que não vão à escola e aqueles que não sabem fazer o sinal da cruz. Atrás deste imperativo e convite do profeta Isaías, há substancialmente o convite habitual à conversão: Mas como eu posso me converter? ‘Aprendam a fazer o bem!’. E como faço o bem? É simples! ‘Busquem a justiça, socorram o oprimido, façam justiça ao órfão, defendam a causa da viúva’. Recordemos que em Israel os mais pobres e necessitados eram os órfãos e as viúvas: façam justiça a eles, vão onde estão as chagas da humanidade, onde há tanta dor … E assim, fazendo o bem, você irá lavar o seu coração”, destacou o Pontífice.
A promessa de um coração perdoado, limpo de todo pecado vem do próprio Deus, que não leva em conta as faltas daqueles que amam o próximo de maneira concreta.
“Se você vem por este caminho ao qual eu convido você – nos diz o Senhor – ‘ainda que os seus pecados sejam como escarlate, eles se tornarão brancos como a neve’. É um exagero, o Senhor exagera: mas é a verdade! O Senhor nos dá o dom do seu perdão. O Senhor perdoa generosamente. ‘Mas eu perdôo você até aqui, depois vamos ver o resto… Não! O Senhor perdoa sempre tudo! Tudo! Mas se você quer ser perdoado, você tem que iniciar o caminho do ‘fazer o bem’. Este é o dom!”, recordou o Papa.
O Evangelho indica ainda que existem aqueles que pregam o certo, mas agem contrários ao que dizem.
“Todos somos astutos e sempre encontramos um caminho que não é o certo, para parecer mais justo do que somos: é o caminho da hipocrisia”, disse o Santo Padre. E acrescentou: “esses fingem de se converter, mas o seu coração é uma mentira: eles são mentirosos! É uma mentira… O seu coração não pertence ao Senhor; pertence ao pai de todas as mentiras, Satanás. E esta é a falsa santidade. Mil vezes Jesus preferiu pecadores a eles. Por quê? Porque os pecadores diziam a verdade sobre si mesmos. ‘Fique longe de mim, Senhor, que eu sou um pecador!’: Pedro disse isso, uma vez. (…) Na segunda semana da Quaresma, há três pontos de reflexão: o convite à conversão, o dom do grande perdão que o Senhor nos dá, e a armadilha, isto é, fingir se converter, mas tomar o caminho da hipocrisia”, completou o Papa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário