quinta-feira, 26 de novembro de 2015

POSSUIDO

Embora a Bíblia não afirme explicitamente se um Cristão pode ou não ser possuído por um demônio, verdades bíblicas relacionadas deixam bem claro que os Cristãos não podem ser possuídos por demônios. Há uma nítida diferença entre ser possuído por um demônio e ser oprimido ou influenciado por um demônio. A possessão demoníaca envolve um demônio tendo controle direto e total sobre os pensamentos e/ou ações de uma pessoa (Mateus 17:14-18, Lucas 4:33-35; 8:27-33). Opressão ou influência demoníaca envolve um demônio ou demônios atacando espiritualmente uma pessoa e/ou incentivando-a a um comportamento pecaminoso. Observe que há várias passagens do Novo Testamento que lidam com a guerra espiritual, mas em nenhuma encontramos instruções para expulsar um demônio de um crente (Efésios 6:10-18). Os crentes são instruídos a resistir ao diabo (Tiago 4:7, 1 Pedro 5:8-9), mas não a expulsá-lo.

Os Cristãos são habitados pelo Espírito Santo (Romanos 8:9-11, 1 Coríntios 3:16, 6:19). Certamente o Espírito Santo não permitiria que um demônio possuísse a mesma pessoa em quem Ele habita. É impensável que Deus permitiria que um de Seus filhos, alguém que Ele adquiriu com o sangue de Cristo (1 Pedro 1:18-19) e tornou uma nova criatura (2 Coríntios 5:17), fosse possuído e controlado por um demônio. Sim, como seguidores de Cristo, estamos em guerra com Satanás e seus demônios, mas não de dentro de nós mesmos. O apóstolo João declara: "Filhinhos, vós sois de Deus e tendes vencido os falsos profetas, porque maior é aquele que está em vós do que aquele que está no mundo" (1 João 4:4). Quem é o Ser que em nós habita? O Espírito Santo. Quem é o que está no mundo? Satanás e seus demônios. Portanto, o crente tem vitória sobre o mundo dos demônios e o caso de possessão demoníaca de um seguidor de Jesus não pode ser defendido biblicamente.

Em vista da forte evidência bíblica de que um Cristão não possa ser possuído por demônios, alguns professores da Bíblia usam o termo "demonização" para se referir a um demônio tendo controle sobre um Cristão. Alguns argumentam que, embora um Cristão não possa ser possuído por demônios, ele ainda pode ser demonizado. Normalmente, a descrição de demonização é praticamente idêntica à descrição da possessão demoníaca. Assim, temos o mesmo problema. Mudar a terminologia não muda o fato de que um demônio não pode habitar ou assumir o controle total de um Cristão. Influência e opressão demoníaca são realidades para os Cristãos, sem dúvida, mas simplesmente não é bíblico dizer que um Cristão pode ser demonizado ou possuído por um demônio.

Grande parte do raciocínio por trás do conceito de demonização é a experiência pessoal de ver alguém que "definitivamente" era um Cristão exibindo evidência de que estava sendo controlado por um demônio. É fundamental, porém, que não permitamos que a experiência pessoal influencie a nossa interpretação das Escrituras. Pelo contrário, devemos filtrar as nossas experiências pessoais através da verdade das Escrituras (2 Timóteo 3:16-17). Ver alguém que achamos ser um Cristão exibindo um comportamento demonizado deve nos levar a questionar a autenticidade da sua fé. Não deve nos levar a alterar a nossa perspectiva sobre se um Cristão pode ser possuído por demônios ou demonizado. Talvez a pessoa realmente seja um Cristão, mas está sendo oprimida por demônio e/ou sofrendo de graves problemas psicológicos. No entanto, novamente, nossas experiências devem passar o teste das Escrituras e não o contrário.Uma veterana do bel canto que se prepara para regressar aos palcos, seis anos depois de a voz lhe ter falhado, perante o olhar de todos, quando interpretava a ária que a enchera de glória. As dúvidas que surgem e que crescem, o trauma emocional que regressará, implacável, antes de a cantora aceitar o seu destino. Estamos em Paris, ano 1970. 14 de Julho, dia da Bastilha. A cantora, Régine Saint Laurent, nunca existiu. O seu criador, Rufus Wainwright, cantautor reconhecido no mundo da pop, compositor com obra operática desde 2009, nasceria apenas em 1973.
PUB
Prima Donna, assim intitulou o canadiano a sua primeira ópera, cuja génese se encontra nas entrevistas para a BBC que Lord Harewood fez a Maria Callas já na fase final da carreira da diva. “Callas foi a faísca que espoletou a ópera, mas depois [Régine Saint Laurent] transformou-se em todo um grupo de mulheres”, diz Rufus Wainwright ao Ípsilon desde Paris, elencando as figuras femininas que compõem a sua protagonista. “Norma Desmond [ou seja, Gloria Swanson em Sunset Boulevard], Jessye Norman, a minha mãe [a cantora folk Kate McGarrigle] e uma série de mulheres brilhantes com um talento genial mas que, a determinado ponto, tiveram que aceitar que os seus corpos já não conseguiam suportar a sua mestria”.
Seis anos depois da estreia Prima Donna chega a Portugal. Dias 27 e 28 de Novembro, no Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, integrada no ciclo Grandes Intérpretes, ouviremos a versão em concerto visual sinfónico de Prima Donna (Orquestra Gulbenkian dirigida por Joana Carneiro; as sopranos Sarah Fox e Kathryn Guthrie nos papéis, respectivamente, de Régine e da sua fiel empregada Marie; e Antonio Figueroa encarnando o jornalista André Letourner). A acompanhar a música, uma sequência filmada realizada pelo italiano Francesco Vezzoli e com a artista e fotógrafa Cindy Sherman como protagonista. Wainwright não adianta muito para não estragar a surpresa, mas afirma que os fãs do trabalho de Sherman serão surpreendidos: “É uma coisa maravilhosa de se ver, quase como uma resposta ao seu próprio trabalho. É sobre transformar-se noutra mulher e, assim, transformar-se nela própria”. Depois, num segundo momento da actuação, Rufus Wainwright, acompanhado pela Orquestra, interpretará algumas das suas canções e árias seleccionadas das óperas que sente mais próximas. Os espectáculos têm início às 21h e os preços dos bilhetes variam entre os 22 e os 50 euros.
Quando editou o seu primeiro álbum em 1998, poucos lhe imaginariam este futuro. Quando três anos depois lançou o segundo disco, Poses, que o transformou num nome destacado da canção confessional, fruto da forma como fazia a sua voz representar as intimidades que expunha e do seu talento de compositor e arranjador (Cigarettes and chocolate milk entrou nos nossos ouvidos para não mais sair), continuámos a não imaginar o que aconteceria em 2009, no decorrer do Festival Internacional de Manchester. Aliás, nem quando editou Poses, nem quando deu continuidade ao seu percurso discográfico com Want One (2003) e Want Two (2004).
10 de Julho de 2009, Palace Theatre em Manchester. Prima Donna estreava por fim, corolário de um processo complexo que, como uma boa ópera, envolveu mudanças inesperadas de guião (começou por ser preparada para a Metropolitan Opera de Nova Iorque), lutas de poder (Rufus Wainwright impondo o francês à Metropolitan Opera, que exigia um libreto em inglês) e prenúncio de morte (a da mãe de Wainwright, a cantora Katie McGarrigle, vítima de uma forma rara de cancro poucos meses após a estreia).
Ali, na sala no norte de Inglaterra, o exuberante Rufus Wainwright fez uma entrada em grande. Surgiu de laço, jaqueta, cartola e uma barba farta mas bem aparada. Surgiu enquanto Giuseppe Verdi (o seu então namorado, hoje marido, o alemão Jörn Weisbrodt, encarnou Giacomo Puccini). Rufus justificou a indumentária com humor. Tendo em conta as tantas vezes que fora a óperas por esse mundo fora para ver e ouvir as obras dos dois gigantes italianos, considerou que seria simpático que lhe retribuíssem a devoção marcando presença na estreia da sua primeira ópera. Podíamos não imaginar que o músico que gravou Poses se lançasse algum dia no universo operático, mas a relação de Rufus Wainwright com ele é longa e intensa.
Possuído pela ópera
Rufus Wainwright está na capital francesa quando recebe o telefonema do Ípsilon. Estamos no início da tarde de sexta-feira, dia 13 de Novembro de 2015, data que ganharia contornos trágicos poucas horas depois, quando do ataque terrorista concertado pelo Daesh. Horas antes do massacre em esplanadas e restaurantes, na sala de concertos Bataclan e no Stade de France, Rufus está feliz numa cidade que ama. “Estou em Paris, por isso só pode estar tudo bem. Estou no cenário de várias óperas, entre as quais está agora incluída a minha”. Não demorará até que recorde como a ópera, paixão desde a adolescência, se atravessou na sua vida. “Há um ditado que diz que não é o amante de ópera que escolhe a ópera, mas a ópera que o escolhe a ele. Foi o aconteceu comigo. Foi como se tivesse sido possuído”, compara com uma gargalhada discreta. Ainda que crente na “possessão” que sofreu, digamos assim, consegue identificar um par de razões que o levaram a aproximar-se desta grandíssima arte de palco. Filho de músicos (a mãe, a já referida Kate McGarrigle, e o pai, Loudon Wainwright III), “tinha uma grande curiosidade pelo som e uma imaginação esfomeada por notas musicais”: “Não as encontras notas em mais lado nenhum como na ópera, especialmente pela presença da voz”. Além disso, acrescenta, “quando era muito novo, adolescente, a SIDA estava presente em todo o lado e parecia que havia pessoas a morrer à nossa volta a toda a hora”. Esse dramatismo, refere, também o aproximava das verdades essenciais que se descobrem no coração de tantas das obras que fazem a história da ópera.
Regressemos ao início. Prima Donna, inicialmente inspirada em Maria Callas, mas que rapidamente se transformou num compósito de várias mulheres, outras “prima donnas”. Não só mulheres. Também encontramos o autor em Régine Saint Laurent. “Ela é seduzida por um jornalista, e isso aconteceu comigo quando era mais novo e, digamos, disponível. Certamente que não me arrependo, afinal, acabei por compor uma ópera onde incluí essa história”.
DR
Não é aquele, porém, o centro da ópera. Nele está o tempo que passa e a forma de lidar com o inevitável envelhecimento. “Uma das razões pelas quais adoro compor ópera nasce da consciência que poderei continuar a fazê-lo até ao dia da minha morte. O mesmo não acontece com um cantor ou com uma cantora, especialmente de ópera. Isso é um peso muito grande, porque cantar torna-se a âncora da sua vida. Régine aceita que não poderá fazê-lo mais. Acho que Callas nunca foi capaz de tomar essa decisão”.
A admiração que tem por estas mulheres maiores que vida, seres humanos que nunca vemos verdadeiramente como tal – como que emanam uma luz sobrenatural que nos encandeia e hipnotiza -, é tão grande que nos confessa que veria como elogio classificarem-no como uma delas, uma “prima donna”. “Quando pensamos naquilo com que tiveram que lidar e no quão difícil era ser uma artista durante o Romantismo ou no século XVII… Eram mulheres incrivelmente fortes, inteligentes e, obviamente, emotivas. Não eram mulheres manientas com quem era difícil lidar, eram alguém a que não podíamos escapar, que nunca poderíamos pôr de parte”.
No momento em que leva em digressão Prima Donna na sua versão concerto sinfónico, Rufus Wainwright continua a trabalhar na sua segunda ópera, inspirada nas Memórias de Adriano de Marguerite Yourcenar, uma encomenda da Canadian Opera Company com estreia marcada para 2018. E prosseguirá o seu percurso enquanto cantautor do universo pop. Sem desejos de reunir numa só essas duas dimensões da sua criatividade. “Impressiona-me a distância entre os dois idiomas, imenso como o Grand Canyon. Por um lado, seria óptimo juntá-los, por outro, adoro viajar de um plano para o outro. São ambos parte de mim, mas muito diferentes e é essa diferença que adoro. Cada um com as suas virtudes, com a sua personalidade”.
O Rufus pop não é o Rufus compositor de ópera. Mas são ambos Rufus Wainwright.

Nenhum comentário:

Postar um comentário