Os quilombos constituíram-se em locais de refúgio dos escravos africanos e afrodescendentes em todo o continente americano.[1] Eram entendidos pelo Conselho Ultramarino do governo português em 1740 como todo "agrupamento de negros fugidos que passe de cinco, ainda que não tenham ranchos levantados em parte despovoada nem se achem pilões neles". A definição antropológica da Associação Brasileira de Antropologia de 1989 para esse agrupamento é: toda comunidade negra rural que agrupe descendentes de escravos, vivendo de cultura de subsistência e onde as manifestações culturais têm forte vínculo com o passado.
No Brasil, abrigavam também minorias indígenas e brancas. Ao longo da América, tinham diversas denominações: cimarrones em algumas partes da América espanhola; palenques em Cuba (1677, 1785 e 1793) e Colômbia (1600); Maroons na Jamaica (1685) e Suriname (1685 com a fuga do seu fundador); marrons no Haiti(1665, independente em 1804); Cumbes na Venezuela (1552, 1763, 1765) (CARVALHO, 1996); quilombos e mocambos no Brasil.[2]
Os escravos fugiam das fazendas entre os séculos XVI e XIX, e se abrigavam nos quilombos para se defenderem da escravidão e resgatarem a cosmovisão africana e os laços de família perdidos com a escravização. Neles, existiam manifestações religiosas e lúdicas, como a música e a dança. O mais famoso deles na história do Brasilfoi o de Palmares. Denominam-se "quilombolas" os habitantes dos quilombos. Atualmente, as comunidades quilombolas passam por um processo de reconhecimento legal de sua existência por parte dos governos nacionais e das organizações internacionais.[3] [4]
Índice
[esconder]Etimologia
A palavra "quilombo" tem origem nos termos "kilombo" (Quimbundo) e "ochilombo" (Umbundo), estando presente também em outras línguas faladas ainda hoje por diversos povos Bantus que habitam a região de Angola, na África Ocidental. Originalmente, designava apenas um lugar de pouso, utilizado por populaçõesnômades ou em deslocamento; posteriormente passou a designar também as paragens e acampamentos das caravanas que faziam o comércio de cera,escravos e outros itens cobiçados pelos colonizadores. Significava também "acampamento guerreiro",[5] "capital, povoação, união".[6] Porém foi só no Brasil que o termo "quilombo" ganhou o sentido de comunidades autônomas de escravos fugitivos.[7]
Legislação
As comunidades quilombolas, de acordo com certos critérios, podem pleitear ao Estado brasileiro:
- O reconhecimento oficial como comunidade quilombola, pela Fundação Cultural Palmares;
- O título de propriedade da terra, como consta na Constituição de 1988 (ver Terras quilombolas no Brasil);
- O acesso a projeto de sustentabilidade, preservação e valorização de seus patrimônios histórico-culturais, assegurado nos Artigos 214, 215 e 216 da Constituição do Brasil.
Características
Tradicionalmente, os quilombos eram das regiões de grande concentração de escravos, afastados dos centros urbanos e em locais de difícil acesso. Os quilombos da Confederação Quilombola do Campo Grande, em Minas Gerais, conhecida como Quilombo do Campo Grande, alteram em muito esse conceito generalizante, pois, a partir de 1735, se formaram e se fortaleceram com pretos forros e seus escravos, brancos pobres e seus escravos, além de escravos fugidos da escravidão. Todos eles fugiam do sistema tributário da capitação que vigorou nas Minas no período de 1735 a 1750.[8]
Embrenhados nas matas, selvas ou morros, esses núcleos se transformaram em aldeias, dedicando-se à economia de subsistência e às vezes ao comércio, alguns tendo mesmo prosperado. Existem registros de quilombos em todas as regiões do país, com destaque ao estado de Alagoas, na região do atual município de União dos Palmares, onde surgiu o principal e maior quilombo que já existiu: o Quilombo dos Palmares, na então Capitania de Pernambuco, quando Alagoas era ainda comarcapernambucana.[9] [10] Segundo os registros, existem quilombos nos seguintes estados brasileiros: Maranhão, Pernambuco, Espírito Santo, Bahia, Goiás, Mato Grosso,Pará, Amapá, Acre, Rio Grande do Norte, Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Sergipe, Ceará, Rio Grande do Sul, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Tocantins,Piauí, Paraíba e Ceará.
Os seus habitantes,[11] denominados de "quilombolas", eram, originalmente, agrupamentos de ex–escravos fugidos de seus senhores desde os primeiros tempos doperíodo colonial. Em algumas épocas e locais, tentaram reproduzir a organização social africana,[12] inclusive com a escolha de reis tribais.
Quanto à violência praticada pelos quilombos e quilombolas, Luiz Gonzaga da Fonseca, no seu livro "História de Oliveira", na página 37, descreve o caos provocado noCaminho de Goiás, a Picada de Goiás, pelo quilombolas do Quilombo do Ambrósio, o principal quilombo de Minas Gerais:
Não há dúvida que esta invasão negra, fora provocada por aquele escandalosa transitar pela picada, e que pegou a dar na vista demais. Goiás era umaCanaã. Voltavam ricos os que tinham ido pobres. Iam e viam mares de aventureiros. Passavam boiadas e tropas. Seguiam comboios de escravos. Cargueiros intérminos, carregados de mercadorias, bugigangas, minçangas, tapeçarias e sal. Diante disso, negros foragidos de senzalas e de comboios em marcha, unidos a prófugos da justiça e mesmo a remanescentes dos extintos cataguás, foram se homiziando em certos pontos da estrada ("Caminho de Goiás" ou "Picada de Goiás"). Essas quadrilhas perigosas, sucursais dos quilombolas do Rio das Mortes, assaltavam transeuntes e os deixavam mortos no fundo dos boqueirões e perambeiras, depois de pilhar o que conduziam. Roubavam tudo. Boiadas. Tropas. Dinheiro. Cargueiros de mercadorias vindos da Corte (Rio de Janeiro). E até os próprios comboios de escravos, matando os comboeiros e libertando os negros trelados. E com isto, era mais uma súcia de bandidos a engrossar a quadrilha. Em terras oliveirenses, açoitava-se grande parte dessa nação de 'caiambolas organizados' nas matas do Rio Grande e Rio das Mortes, de que já falamos. E do combate a essa praga é que vai surgir a colonização do território (de Oliveira (Minas Gerais) e região). Entre os mais perigosos bandos do Campo Grande, figuravam o quilombo do negro Ambrósio e o negro Canalho.[13] |
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Embora a escravidão no Brasil tenha sido oficialmente abolida em 13 de maio de 1888, alguns desses agrupamentos chegaram aos nossos dias, graças ao seu isolamento, como, por exemplo, Ivaporunduva, próximo ao rio Ribeira de Iguape, no estado de São Paulo.
A maioria dos quilombos tinha existência efêmera, pois uma vez descobertos, a sua repressão era marcada pela violência por parte dos senhores de terras e de escravos, com o duplo fim de se reapossar dos elementos fugitivos e de punir exemplarmente alguns indivíduos, visando a atemorizar os demais cativos.
Escravidão nos Quilombos
Apesar de representar uma resistência à escravidão, muitos quilombos contavam com a escravidão internamente. Esta prática levou vários teóricos a interpretarem a prática dos quilombos como um conservadorismo africano, que mantinha as diversas classes sociais existentes na África, incluindo reis, generais e escravos.[14] [15]
Contudo, a escravidão nos quilombos em nada se assemelhava à escravidão dos brancos sobre os negros, sendo os escravos considerados como membros das casas dos senhores, aos quais deviam obediência e respeito.[16] Semelhante à escravidão entre brancos, comum na Europa na Alta Idade Média.[17]
Assim, a prática da escravidão nos quilombos tinha dupla finalidade:[18]
- a primeira, de aculturar os escravos recém-libertos às práticas do quilombos, que consistiam em trabalho árduo para a subsistência da comunidade, já que muitos dos escravos libertos achavam que não teriam mais que trabalhar; e
- a segunda, que visava a diferenciar os ex-escravos que chegavam aos quilombos pelos próprios meios (escravos fugidos, que se arriscavam até encontrar um quilombo. Sendo, neste trajeto, perseguidos por animais selvagens e pelos antigos senhores, e ainda, correndo o risco de serem capturados por outros escravistas) daqueles trazidos por incursões de resgates (escravos libertados por quilombolas que iam às fazendas e vilas para libertar escravos).
Estudos genéticos
Estudos genéticos realizados em quilombos têm revelado que a ancestralidade africana predomina na maioria deles, embora seja bem significativo a presença de elementos de origem europeia e indígena nessas comunidades. Isso mostra que os quilombos não foram povoados apenas por africanos, mas também por pessoas de origem europeia e indígena que foram integradas nessas comunidades. Os estudos mostram que a ancestralidade dos quilombolas é bastante heterogênea, chegando a ser quase que exclusivamente africana em alguns, como no quilombo de Valongo, no Sul, enquanto em outros a ancestralidade europeia chega até a predominar, como no caso do quilombo do Mocambo, na Região Nordeste do Brasil, mas isso é a exceção.[19]
Ancestralidade genética de habitantes de quilombos[20] | |||
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Nome do quilombo | Africana | Europeia | Indígena |
Cametá (Norte) | 48% | 17,9% | 34,1% |
Cajueiro (Nordeste) | 67,4% | 32,6% | 0% |
Curiaú (Norte) | 73,6% | 26,4% | 0% |
Paredão (Sul) | 79,2% | 2,8% | 18,1% |
Trombetas (Norte) | 62% | 27% | 11% |
Valongo (Sul) | 97,3% | 2,7% | 0% |
Mimbó (Nordeste) | 61% | 17% | 22% |
Sítio Velho (Nordeste) | 72% | 12% | 16% |
Referências
- ↑ O chihuahua anão: um blog de antropologia aleatória. Disponível emhttp://igorreno.wordpress.com/2010/01/01/suriname-e-maroons-outras-informacoes/. Acesso em 31 de março de 2013.
- ↑ Quilombos (vídeo)
- ↑ BALDI, C. A. As comunidades quilombolas e o seu reconhecimento jurídico. Disponível emhttp://6ccr.pgr.mpf.mp.br/documentos-e-publicacoes/docs_artigos/artigo_cesar_augusto_baldi.pdf. Acesso em 31 de março de 2013.
- ↑ PYL, B. e SANTINI, D. Repórter Brasil. 14 de novembro de 2012. Disponível emhttp://reporterbrasil.org.br/2012/11/consciencia-negra-apenas-uma-comunidade-quilombola-foi-reconhecida-em-2012/. Acesso em 31 de março de 2013.
- ↑ PEPETELA. A gloriosa família: o tempo dos flamengos. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1999. p. 407.
- ↑ FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986. p. 1 435.
- ↑ Vídeo: Tradição e desenvolvimento
- ↑ MARTINS, T. J. Quilombo do Campo Grande - A História de Minas que se Devolve ao Povo. Contagem. Santa Clara Editora. 2008.
- ↑ Obs. O Quilombo de Palmares teve nove vilas ou núcleos. O Quilombo do Campo Grande, de Minas Gerais, contou com 27 vilas ou núcleos.
- ↑ Cronologia do Quilombo dos Palmares
- ↑ Nação Palmares (vídeo)
- ↑ Quilombos discutem seus problemas durante encontro em Luziânia (GO). (vídeo)
- ↑ História de Oliveira,Edição Centenário, 1961, p. 37 - sem citar qualquer fonte. A evidência é a de que sua fonte tenha sido a Carta da Câmara de Tamanduá à Rainha, 1793, publicada pela Revista do APM, ano II, 1897. Vide ainda Quilombo do Campo Grande - História de Minas que se Devolve ao Povo, p. 355-363.
- ↑ Libby, Douglas Cole e Furtado, Júnia Ferreira. Trabalho livre, trabalho escravo: Brasil e Europa, séculos XVIII e XIX. págs. 321-322. Annablume, 2006 - ISBN 8574196274, 9788574196275
- ↑ Libby, Douglas Cole e Furtado, Júnia Ferreira. Trabalho livre, trabalho escravo: Brasil e Europa, séculos XVIII e XIX. págs. 321-322. Annablume, 2006 - ISBN 8574196274, 9788574196275
- ↑ Landmann, Jorge. Tróia Negra. Mandarim, 1998 - ISBN 8535400931, 9788535400939
- ↑ Cornwell, Bernard. O Último Reino. Record, 2006 - ISBN 8501073520, 9788501073525
- ↑ Landmann, Jorge. Tróia Negra. Mandarim, 1998 - ISBN 8535400931, 9788535400939
- ↑ [1]
- ↑ [2]
Bibliografia
- MOURA, Clóvis. Os quilombos e a rebelião negra. São Paulo: Brasiliense. 1987. Coleção Tudo é História.
- CARVALHO. José Jorge. O quilombo do Rio da Rãs: história, tradição e lutas. Salvador: EDUFBA, 1996.
Ligações externas
- Quilombo do Campo Grande - Confederação Quilombola.
- Filme Quilombo, do Campo Grande aos Martins.
- Mapa do Campo Grande.
- Quilombos
- Livro "Um Estudo Sócio-lingüístico das Comunidades Negras do Cafundo, do Antigo Caxambu e de seus Arredores" de Sílvio Vieira de Andrade Filho
- Remanescentes de Quilombos
- Quilombos do Ribeira
- Quilombo
- Quilombos de Alagoas
- Território negro
- Aldeias familiares Conceito de quilombos urbanos
- Comissão Pró-Índio de São Paulo
- Quilombos no Paraná
- Quilombo São José da Serra
No período de escravidão no Brasil (séculos XVII e XVIII), os negros que conseguiam fugir se refugiavam com outros em igual situação em locais bem escondidos e fortificados no meio das matas. Estes locais eram conhecidos como quilombos. Nestas comunidades, eles viviam de acordo com sua cultura africana, plantando e produzindo em comunidade. Na época colonial, o Brasil chegou a ter centenas destas comunidades espalhadas, principalmente, pelos atuais estados da Bahia, Pernambuco, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais e Alagoas.
Na ocasião em que Pernambuco foi invadida pelos holandeses (1630), muitos dos senhores de engenho acabaram por abandonar suas terras. Este fato beneficiou a fuga de um grande número de escravos. Estes, após fugirem, buscaram abrigo no Quilombo dos Palmares, localizado em Alagoas.
Esse fato propiciou o crescimento do Quilombo dos Palmares. No ano de 1670, este já abrigava em torno de 50 mil escravos. Estes, também conhecidos como quilombolas, costumavam pegar alimentos às escondidas das plantações e dos engenhos existentes em regiões próximas; situação que incomodava os habitantes.
Esta situação fez com que os quilombolas fossem combatidos tanto pelos holandeses (primeiros a combatê-los) quanto pelo governo de Pernambuco, sendo que este último contou com os serviços do bandeirante Domingos Jorge Velho.
A luta contra os negros de Palmares durou por volta de cinco anos; contudo, apesar de todo o empenho e determinação dos negros chefiados por Zumbi, eles, por fim, foram derrotados.
Zumbi dos Palmares: líder do Quilombo dos Palmares
Os quilombos representaram uma das formas de resistência e combate à escravidão. Rejeitando a cruel forma de vida, os negros buscavam a liberdade e uma vida com dignidade, resgatando a cultura e a forma de viver que deixaram na África e contribuindo para a formação da cultura afro-brasileira.
A Campanha Abolicionista e a Abolição da Escravatura
A partir da metade do século XIX a escravidão no Brasil passou a ser rechaçada pela Inglaterra. Com o objetivo de ampliar seu mercado consumidor no Brasil e no mundo, o Parlamento Inglês aprovou a Lei Bill Aberdeen (1845), que proibia o tráfico de escravos, conferindo poder aos ingleses de abordarem e aprisionarem navios de países que faziam esta prática.
O Brasil, em 1850 cedendo às pressões inglesas e aprovou a Lei Eusébio de Queiróz que acabou com o tráfico negreiro. Em 28 de setembro de 1871 era sancionada a Lei do Ventre Livre que concedia a liberdade aos filhos de escravos nascidos a partir daquela data. E no ano de 1885 era promulgada a Lei dos Sexagenários que garantia a liberdade aos escravos com mais de 60 anos de idade.
Apenas no final do século XIX é que a escravidão tornou-se proibida mundialmente. No Brasil, a abolição ocorreu em 13 de maio de 1888 com a publicação da Lei Áurea, feita pela Princesa Isabel.
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