Febre reumática (FR), também chamada de reumatismo infeccioso é uma doença autoimune inflamatória que causa danos permanentes às articulações, à pele, ao coração e ao cérebro.[1] A doença normalmente desenvolve-se entre duas a quatro semanas depois de uma faringite estreptocócica.[2]
Índice
[esconder]Causas[editar | editar código-fonte]
A febre reumática é uma complicação da infecção da garganta, escarlatina ou infecção de pele[3] por bactéria Estreptococo Beta-hemolítico do Grupo A (EBGA).[4] Se a infecção não foi adequadamente tratada pode induzir febre reumática em até três por cento das pessoas.[5] Acredita-se que o mecanismo subjacente implique a produção de anticorpos contra os próprios tecidos da pessoa. Dependendo da constituição genética, algumas pessoas têm mais probabilidades de adquirir a doença quando expostos a bactérias do que outras. Outros factores de risco estão relacionados à subnutrição e à pobreza.[1] O diagnóstico da febre reumática é geralmente feito com base na presença de sinais e sintomas associados a indícios duma infecção estreptocócica recente.[6]
Fisiopatologia[editar | editar código-fonte]
A reação autoimune é causada por mimetismo molecular. Ambas respostas imunitárias do paciente (tanto linfócitos B e T mediadas por células) se tornam incapazes de distinguir entre as moléculas do streptococcus e do tecido saudável do hospedeiro. Linfócito T auxiliar 1 e citocinas Th17 parecem ser mediadores-chave dos danos ao tecido cardíaco na febre reumática.[7]
Sinais e sintomas[editar | editar código-fonte]
Os sinais e sintomas incluem febre, dores nas articulações, movimentos involuntários dos músculos e ocasionalmente erupção cutânea sem comichão conhecida como eritema marginatum. O coração é afectado em cerca de metade dos casos. Os danos às válvulas cardíacas, a conhecida doença reumática cardíaca, geralmente ocorrem depois de múltiplos ataques, mas por vezes um único ataque pode lesar essas estruturas. As válvulas cardíacas danificadas podem provocar insuficiência cardíaca, fibrilação atrial e endocardite infecciosa.[1]
Diagnóstico[editar | editar código-fonte]
Pode ser estabelecido mediante a avaliação das manifestações clínicas associadas à comprovação da infecção estreptocócica anterior. Os critérios maiores são[8]:
- Poliartrite migratória: Inflamação de articulações que variam com o tempo.
- Cardite: Inflamação cardíaca, principalmente nas válvulas, produzindo sopros.
- Coréia de Sydenham ou dança de São Vito: movimentos involuntários abruptos do tronco e membros.
- Eritema marginatum: irritação cutânea transitório, esbranquiçado no centro e vermelho nas bordas em "S", encontrados no tronco e extremidades.
- Nódulos subcutâneos: indolores, principalmente em pernas e braços.
Os critérios menores são: dor nas articulações, febre, marcadores de fase aguda elevadas (como Proteína c-reativa) e bloqueio cardíaco de primeiro grau. Doppler pode ser usado como suplementar, mas faltam evidências sobre sua sensibilidade e especificidade diagnóstica.[9]
Como exames acessórios pode-se fazer uma dosagem sérica de estreptolisina O, por ser um marcador fiável de infecção por Streptococcus pyogenes(exceto nas infecções cutâneas onde esta toxina não é produzida). Degeneração das válvulas podem ser verificadas com eletrocardiograma ou um ecocardiograma.[10]
Epidemiologia[editar | editar código-fonte]
A febre reumática atinge cerca de 325 mil crianças todos os anos e actualmente cerca de 18 milhões de pessoas padecem da doença. A febre reumática afecta com maior frequência indivíduos entre os 5 e 14 anos de idade,[1] e cerca de 20% das pessoas que sofrem pela primeira vez os ataques são adultos.[11] A doença é mais comum no mundo em desenvolvimento e entre os povos indígenas no mundo desenvolvido.[1] Em 2013 provocou 275 mil mortes, abaixo das 374 mil em 1990.[12] A maioria das mortes ocorreram no mundo em desenvolvimento, em que a cada ano morreram tantos quanto 12,5% dos afectados.[1] Acredita-se que as primeiras descrições desta condição de saúde remontam ao século V a.C. nos escritos de Hipócrates.[13] A doença é assim denominada devido aos sintomas similares a algumas das doenças reumáticas.[14]
Com o avanço da terapia antibiótica no mundo o número de vítimas caiu de 463 mil em 1990 para 345 mil em 2010.[15]
Brasil[editar | editar código-fonte]
No Brasil, estima-se 5000 novos casos por anos, afetando igualmente meninos e meninas, e sendo responsável por 40% das cirurgias cardíacas no país. [16]Metade sofrem sérios problemas cardíacos e a maioria sofre de sérios distúrbios articulares.
A taxa de mortalidade por doença cardíaca causada por febre reumática em pacientes internados pelo SUS foi de cerca de 7,5% e o gasto aproximado de 150 milhões de reais em 2007. O cálculo do índice de Anos Potenciais de Vida Perdidos ajustados por incapacidade (APVP) é de 26 anos por paciente, totalizando 65 mil anos de vida perdidos.[17] Felizmente, conforme o tratamento de faringites estreptocócicas com antibiótico se torna mais disseminado e eficiente, o número de casos tende a reduzir em todo o mundo.
Prevenção[editar | editar código-fonte]
O tratamento de pessoas que tenham faringite estreptocócica com antibióticos, como penicilina, diminui o risco de desenvolvimento da febre reumática.[18] Para evitar o mau uso de antibióticos, o tratamento normalmente implica um exame ao paciente com garganta inflamada devido à faringite, o que nem sempre é possível em países em desenvolvimento. Outros cuidados de saúde preventivos passam por criar melhores condições de saneamento básico. Para aqueles com febre reumática e cardiopatia reumática, recomenda-se um tratamento prolongado com antibióticos. O paciente poderá retornar gradualmente às actividades rotineiras após um ataque.
Doze modelos de vacinas, contra as 26 variedades de Streptococcus de grupo A estão sendo desenvolvidas. [19] Inclusive um modelo brasileiro que foi bem sucedido em camundongos.[20]
Tratamento[editar | editar código-fonte]
A erradicação das bactérias que persistiram após a infecção inicial é feita com penicilina, a dose varia com a idade e peso da pessoa. Pacientes alérgicos a penicilina têm como alternativa a eritromicina por 10 dias.
O repouso é recomendado por um período de 2 a 3 meses. O paciente com poliartrite sem cardite deve fazer uso de anti-inflamatório não esteroide, como ácido acetilsalicílico (AAS®, Aspirina®) por 2 semanas e reduzir a dose gradativamente até completar os meses de repouso recomendados.
A cardite exige o uso de anti-inflamatório mais poderoso. É recomendada terapia corticosteroide, bem como fármacos específicos, se houver insuficiência cardíaca. Os movimentos involuntários (coreia) são tratados com repouso e anticonvulsivantes como valproato e carbamazepina.[21]
Uma vez que a pessoa desenvolve um quadro de cardiopatia reumática, o tratamento torna-se mais difícil. Em caso de grave estenose ou insuficiência valvular pode ser necessária a valvuloplastia das válvulas afetadas, mas nem sempre é possível reverter os danos. Em casos menos graves, a inserção de um cateter com balao, inflado na válvula com estenose, pode reduzir a obstrução. Já em pacientes que desenvolvem cardite moderada ou severa que se manifesta como a insuficiência cardíaca congestiva é necessário fazer o uso prolongado de diuréticos, betabloqueadores e inibidores da ECA.
Complicações[editar | editar código-fonte]
Quando não tratada nas primeiras semanas, a doença cardíaca reumática causa danos permanentes ao coração causando[22]:
- Estenose de válvula cardíaca: obstrução do fluxo sanguíneo, principalmente da válvula mitral.
- Regurgitação: retorno do sangue para a cavidade anterior.
- Fibrilação atrial: batimento irregular e caótico das câmaras superiores do coração (átrios).
- Insuficiência cardíaca: incapacidade do coração de bombear sangue suficiente para o corpo.
Ligações externas[editar | editar código-fonte]
Referências
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