sexta-feira, 4 de agosto de 2017

ARTIGO 126 SEGUNDA PARTE

São os princípios penais constitucionais (legalidade, lesividade, intervenção mínima e culpabilidade) que vão conferir ao Direito Penal a condição de subsistema autônomo, distinto dos demais.
Assim, alguma regra jurídica que não atenda os princípios informadores do Direito Penal, ou será uma norma inconstitucional, ou então não será uma norma penal, pertencendo a outro subsistema constitucional. Adotar uma “terceira via” significa retirar do Direito Penal a unidade sistemática, já que rompida a fundamentação das normas nos princípios próprios de Direito Penal. Por isso, entendemos que não basta a fundamentação das normas penais nos princípios constitucionais estruturantes; para que sejam elas chamadas de normas penais, precisarão atender aos princípios definidores do Direito Penal.
São exatamente esses aspectos que iremos considerar. O texto constitucional em vários momentos faz alusão a princípios que poderão dar guarida as pessoas, sem nenhuma discriminação. Neste diapasão é que vamos adentrar para que o condenado possa alcançar o cumprimento de sua pena nos exatos moldes da condenação.
Não temos dúvida de que o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da igualdade e o princípio da liberdade estão conectados com o tema, devendo agora, ser utilizados para amparar a quem tanto precisa. Pois, o ordenamento jurídico não pode deixar de dar guarida a todos àqueles que pleitearem do Estado essa proteção.
A respeito do princípio da dignidade humana, importante pontuar algumas considerações sobre o tema.
Não me parece ser possível falar em dignidade do ser humano, sem imaginar que todos, realmente todos, possam ser tratados de forma idêntica. Ou atribuímos ao princípio a sua verdadeira importância, ou brincamos de interpretar a lei.
Tratar com dignidade significa não excluir e se houver exclusão que não haja tratamento indigno. Ademais, é o próprio legislador que tem que se preocupar em manter a relevância daqueles mandamentos que ele mesmo identificou como princípio constitucional, devendo não apenas preservar, mas promover a dignidade, impondo a todos os seus cidadãos a plena observância de tamanha magnitude.
O insigne Rizzatto Nunes[8], em primorosa obra sobre o tema, afirma:
“[...] Aliás, é um verdadeiro supraprincípio constitucional que ilumina todos os demais princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais. E por isso não pode o Princípio da Dignidade Humana ser desconsiderado em nenhum ato de interpretação, aplicação ou criação de normas jurídicas.”
Reputa-se que o princípio da dignidade não é um conceito constitucional, mas um dado apriorístico, preexistente a toda experiência e verdadeiro fundamento da República brasileira, atraindo o conteúdo de todos os direitos fundamentais.
Não sendo só um princípio de ordem jurídica, mas também de ordem econômica, política, cultural, etc.
É um valor supremo e acompanha o homem até sua morte, por ser da essência da natureza humana. A dignidade não admite discriminação alguma e não estará assegurada se o indivíduo é humilhado, perseguido ou depreciado, sendo norma que subjaz a concepção de pessoa como um ser ético-espiritual que aspira, determinar-se e se desenvolve em liberdade.
Transgredir princípios tão caros em um Estado Democrático, como o princípio da igualdade de todos perante a lei, o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da atuação do Estado sempre voltada ao bem comum, é atitude demasiadamente perigosa para a própria garantia da pacificação social, da dignidade da própria justiça, pois restringir garantias constitucionais em detrimento de todo um sistema, é voltar ao estado da barbárie e do autoritarismo.
Outrossim, importante repetir o ensinamento basilar do Direito Constitucional, lembrando-se que tais regras, por retratarem princípios, direitos e garantias fundamentais, se sobrepõem a quaisquer outras.
A idéia da igualdade interessa particularmente ao Direito, pois ela se liga à idéia de Justiça, que é regra das regras de uma sociedade e que dá o sentido ético de respeito a todas as outras regras.
Uma vez consignado no título executivo o regime semiaberto para o cumprimento da pena, cabe ao Estado, o aparelhamento do sistema penitenciário para atender à determinação. Na falta de local adequado para o semiaberto, os condenados devem aguardar em regime mais benéfico até a abertura de vagas.
É inegável que o regime determinado na sentença penal condenatória deve orientar a sua execução.
Mas, na realidade, vemos que em muitos casos, há condenados no regime semiaberto que se tornam foragidos da justiça, pois sabem da inexistência de estabelecimentos penais adequados para o cumprimento de suas penas e, que se seus mandados de prisões forem cumpridos, certa e obrigatoriamente serão postos em estabelecimentos de regime fechado. Ou seja, os condenados ficam foragidos para não se submeterem à realidade, que seria o cumprimento da pena à margem da condenação, pois a falta de local adequado não tem o condão de admitir o regime mais gravoso para o seu cumprimento.
Sabe-se que quando o mandado de prisão foi expedido, o condenado será colocado em regime fechado, onde permanecerá possivelmente por meses até ser obtida vaga no regime fixado na sentença.
Não pode o condenado sofrer as conseqüências de uma situação gravosa a que não deu causa. Sendo dever de o Estado providenciar as condições necessárias à ressocialização daqueles que se encontram sob sua custódia.
Sabemos que a lei, deve aferir as hipóteses dos fatos subjetivos e objetivos para a concessão a certos direitos aos presos, entretanto, a proposta da alteração na LEP e este novo benefício do instituto da remição penal, não adentram nos méritos das expectativas de direito subjetivos e objetivos do apenado, eis que somente se está viabilizando uma garantia constitucional, dando-lhes o direito de se ver descontado da sua pena os dias em que, injustamente, ficou enclausurado em regime mais rigoroso do constante do pronunciamento condenatório.
Sob este enfoque, pensamos que a principal razão de ser da alteração da LEP dando o direito ao apenado de remir sua pena apenas pelo fato de estar cumprindo sua pena diferentemente do estabelecido na condenação, não é em si uma minimização da condenação ou um benefício indevido, mas, sobretudo o direito basilar e principal de qualquer pessoa – o da dignidade humana.
A inclusão de um novo artigo na LEP visa fundamentalmente evitar recursos e a impetração de remédios heróicos nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Superiores, haja vista que o alegado nestes casos é sempre o constrangimento ilegal ante a ausência de vagas no regime semiaberto. Essa alteração viria de encontro aos anseios dos condenados e a lacuna na lei sobre o assunto, evitando assim os inúmeros recursos.
De todo o exposto, a reformulação da LEP referente à inexistência legal do condenado, de não ter o direito de cumprir sua pena nos exatos termos de sua condenação e da ausência de vagas no regime semiaberto e, consequentemente ser colocado em regime fechado para cumprimento de sua pena, é que a inserção de mais um artigo na LEP é de suma importância. Ficaria desta maneira assim definido o texto legal:
"SEÇÃO IV
Da Remição
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.
§ 1º A contagem do tempo para o fim deste artigo será feita à razão de 01 (um) dia de pena por 03 (três) de trabalho.
§ 2º O preso impossibilitado de prosseguir no trabalho, por acidente, continuará a beneficiar-se com a remição.
§ 3º A remição será declarada pelo Juiz da execução, ouvido o Ministério Público.
Art. 127. O condenado que for punido por falta grave perderá o direito ao tempo remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar.
Art. 128. O tempo remido será computado para a concessão de livramento condicional e indulto.
Art. 129. A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao Juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando e dos dias de trabalho de cada um deles.
Parágrafo único. Ao condenado dar-se-á relação de seus dias remidos.
Art. 130. Constitui o crime do artigo 299 do Código Penal declarar ou atestar falsamente prestação de serviço para fim de instruir pedido de remição.
Art. 126-A - O condenado que cumpre pena privativa de liberdade em regime fechado, mas efetivamente condenado em regime semiaberto, poderá remir, inclusive de forma cumulativa pelo trabalho, caso não sejam respeitadas as disposições de sua sentença, ao direito ao estabelecimento penal adequado, parte do tempo de execução da pena.
Parágrafo 1° - A contagem do tempo para o fim deste artigo será feira à razão de 01 (um) dia de pena por 03 (três) dias, cumprindo-a em estabelecimento fechado, tendo este o direito de cumpri-la no regime semiaberto.”
Desta forma, na ausência de vagas para o cumprimento de pena em regime semiaberto e tendo o apenado que cumpri-la em regime fechado, seria atingido pela remição, pelo simples fato de ser submetido ao constrangimento ilegal de estar cumprindo sua pena diversamente da imposta no título executivo penal.
A contagem para efeitos de remição por esta proposta de mudança seria realizada assim como pela contagem pelo trabalho, ou seja, a cada 03 (três) dias cumprindo pena em regime fechado, mas tendo o direito de cumpri-la em regime semiaberto, remiria 01 (um) dia de sua pena.
Posto que, uma vez estabelecido nos termos da sentença o cumprimento da reprimenda corporal em regime semiaberto, mostra-se absolutamente descabida a manutenção do condenado em regime fechado, e, portanto, mais gravoso, o que consubstancia não só o desvio na execução, mas, igualmente, patente desrespeito à finalidade ressocializadora almejada na execução penal, instando asseverar que se ao Estado fora concedido o poder de privar a liberdade de um indivíduo, tal prerrogativa não deve ultrapassar os limites previstos em Lei e, dessarte, os definidos na decisão condenatória.
Enfim, a cada três dias cumprindo pena em regime fechado, o condenado teria um dia de remição na sua pena.
Para corroborar esse pensamento da reformulação da LEP, não podemos deixar de citar os inúmeros projetos e programas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)[9], para aprimorar a justiça brasileira e o próprio sistema penal brasileiro. Dentre eles, poderemos destacar: - O Programa Começar de Novo, - O Plano de Gestão Criminal; - os Mutirões Carcerários; - os Relatórios Anuais “Justiça em Números”; - As 10 metas instituídas pelo Conselho para julgar os processos antigos, dentre outras.
Temos que ter em mente que o moderno Direito Penal deve se basear também, em três pontos básicos: na intervenção mínima, onde o Direito Penal deve atuar apenas em casos extremos, deixando certos casos do atual Código Penal, para outros ramos do Direito; na descriminalização formal, apresentando no Poder Legislativo, leis que descriminalizem certas condutas consideradas como crimes; e na interpretação restritiva, onde a norma que não se adeque a Constituição Federal deve ser invalidada.
Iniciamos o estudo sobre a Execução Penal visando suas generalidades e princípios norteadores, e chegamos à análise da remição da pena, que poderá ser obtida pelo e, principalmente a implantação de um novo artigo na LEP, no sentido de que não se pode impor ao réu o cumprimento de pena em situação mais gravosa do que a determinada na condenação, sob o fundamento de inexistência de local ou de vaga no local pertinente.
A proposta que nos foi feita no início deste trabalho para analisarmos a necessidade de mudança na LEP foi vista ao longo do texto. Sabemos que se uma lei não produz os efeitos necessários e esperados por ela, esta deve ser mudada no ordenamento jurídico, por afrontar a Carta Maior e seus princípios basilares.
O desconto na pena obtido pelo condenado no desempenho do trabalho e pelo constrangimento ilegal do não cumprimento nos termos da sentença devem ser prêmios a ele concedidos, justamente ou porque exerceu função laborativa ou porque não pode ele arcar com o ônus da desídia do Estado.
Diante disto, podemos constatar que a Lei de Execução Penal, tendo em vista a reinserção do condenado e o efetivo cumprimento das disposições da sentença, não tem cumprido seu papel corretamente, criando um mito sobre a efetiva ressocialização do condenado.
O princípio da individualização da pena, no qual, devem ser levados em consideração às condições pessoais do agente e seus antecedentes, para a aplicação de tal condenação, também não é levada a efeito.
A Lei de Execução Penal e a Constituição Federal traçam os caminhos que devem ser seguidos para reintegrar o condenado ao convívio social. Ocorre que, o que vemos diariamente é completamente ao contrário. Prisões abarrotadas, fugas, rebeliões e ausência total de perspectivas para os detentos.
A mudança, portanto, deve ser feita na Lei de Execução Penal e também no sistema educacional do país, através de políticas educacionais dentro dos presídios como meio de reinserção do condenado na sociedade.
Por todo o exposto, pode-se inferir que o processo penal e a Lei de Execução Penal devem sempre buscar e respeitar os direitos e garantias constitucionais, sendo guiado pelos princípios de nossa Carta Maior, em especial pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Este princípio confere validade e efetividade aos demais princípios, localizando acima de qualquer norma de nosso ordenamento jurídico.
Numerosos estudos demonstram que a superpopulação e o clima social carcerários, a violência, a corrupção e a genérica ociosidade da prisão afetam decisivamente aqueles que foram encarcerados sob o pretexto de serem reeducados e, posteriormente, reinseridos à sociedade.
Hoje, não se ignora que a prisão não regenera nem ressocializa ninguém, ela perverte, corrompe, deforma, avilta, embrutece, é uma fábrica de reincidência, é uma universidade às avessas onde se diploma o profissional do crime.
Se não podemos eliminá-la de uma vez, devemos conservá-la para os casos em que ela é indispensável. Estendê-la, exacerbá-la, é retroceder a um período de fanatismo repressivo, de reações instintivas, de um direito autoritário e desumano, que fica a um passo de outras formas violentas de castigo. Não é com a severidade das penas que se combate ou extingue a criminalidade.
Se assim fosse, bastava estabelecer a pena de morte que os crimes desapareceriam com a só ameaça de sua aplicação.
As estatísticas atuais são alarmantes. A pena de prisão é um remédio opressivo e violento, de consequências devastadoras sobre a personalidade humana, e que deve ser aplica, como verdadeira medida de segurança, aos reconhecidamente perigosos. Há resistências a essa posição, por uma espécie de reação instintiva, que atua no sentido de agravar o sentimento de insegurança resultante do inegável aumento de criminalidade, cujas causas geradoras são bem conhecidas: a miséria, a fome, o desemprego, a injustiça social.
Mais desumano ainda é que o atual sistema penitenciário abriga, seletivamente, os pobres e os desassistidos.
A prisão atinge o condenado em sua integridade física e em sua integridade moral.
Prisão é de fato uma monstruosa opção. O cativeiro das cadeias perpetua-se ante a insensibilidade da maioria, como uma forma ancestral de castigo.
Positivamente, jamais se viu alguém sair de um cárcere melhor do que quando entrou.
De todas as considerações feitas chegamos à iniludível conclusão de que o encarceramento do homem não o melhora, nem o aperfeiçoa, nem corrige a falha cometida, nem o limpa de culpa para um retorno à vida da sociedade que ele perturbou com a sua conduta delituosa.
Acredita-se que o crime não teve sua origem nas prisões, mas sim nas comunidades, onde a ausência e o descaso por parte do Estado possibilitaram o surgimento de uma geração de excluídos que em resposta a essa exclusão com perspicácia e inteligência se orquestram de forma a suprirem suas necessidades básicas de sobrevivência, adentrando, assim, no mundo do crime.
Observa-se, portanto, que muito embora tenhamos em nosso ordenamento pátrio, dispositivos legais que visam garantir a integridade física do condenado e o respeito à sua dignidade humana, infelizmente isso efetivamente não acontece.
A pena de prisão atinge um objetivo exatamente inverso ao proposto pela legislação vigente, pois ao entrar no presídio, o condenado assume o seu papel social de um ser marginalizado, adquirindo as atitudes de um preso habitual e desenvolvendo cada vez mais a tendência criminosa.
Necessário se faz um trabalho de toda a comunidade no sentido de cobrar dos nossos legisladores uma nova política criminal, bem como uma nova política penitenciária, com penas alternativas, porém de forma séria, com trabalho de fato, e para aqueles que necessariamente devem se submeter a um regime fechado, que seus direitos, principalmente humanos, sejam respeitados.
É preciso a transformação do sistema para que a reforma do condenado seja propiciada por instrumentos como a educação e o trabalho, de modo a dar-lhe condições de levar uma vida digna quando sair da prisão, e evitar que o cárcere seja mais penoso do que já é.
A tendência é buscar alternativas para sancionar os criminosos, que não os isolar socialmente. Isto porque a pena de prisão determina a perda da liberdade e da igualdade, que derivam da dignidade humana.
Naturalmente não se esgotam aqui todos os pontos de vista acerca do tema, até porque se trata de objeto de reflexão, podendo ser ampliado o estudo jurídico, ingressando no campo multidisciplinar, isto é, no campo da criminologia, da sociologia, da antropologia, da psicologia, dentre outras.
E, finalmente, será citada a brilhante frase do Ministro Gilson Dipp: "Não podemos ser coniventes com a pena indigna, aquela pena que fere a dignidade humana. E não é bom que o Judiciário transfira sua parcela de culpa e de responsabilidade".

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