sábado, 16 de maio de 2015

DORES DE CABEÇA

Edgard Rafaelli Jr. é médico neurocirurgião, pioneiro no estudo das cefaleias no Brasil. Em coautoria com Dr.Orlando J. Martins, publicou o livro “Dor de cabeça, o que se diz… o que se sabe…” (Editora Lemos).
Talvez não haja no mundo quem nunca tenha sentido dor de cabeça. Depois de um dia agitado e estressante, é possível que a pessoa volte para casa com a cabeça pesada e dolorida, resultado da tensão em certos músculos. Daí, ela toma um comprimido, descansa um pouco e, na manhã seguinte, levanta recuperada para dar andamento a seus compromissos.
No entanto, certos tipos de dor de cabeça têm características bastante diferentes. Algumas são dores pulsáteis e intensas, com manifestações de fotofobia (dificuldade de olhar para a luz) e de fonofobia (rejeição aos ruídos, especialmente aos mais agudos). Há também a dor de cabeça cervicogênica que começa na nuca (fig. 1), atinge o topo da cabeça e desce para os olhos; a dor ligada à inflamação das mucosas que revestem os seios da face nos processos de sinusite (fig. 2) e as terríveis dores de cabeça relacionadas com o nervo trigêmeo, o maior nervo craniano. (fig. 3).
Hoje, felizmente, a maioria dos casos de dor de cabeça conta com tratamento eficaz e para alguns deles existe até a possibilidade de cura.
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DOR DE CABEÇA E ENXAQUECA
Drauzio  O povo considera dor de cabeça um sinônimo de enxaqueca. O que justifica essa confusão?
Edgard Rafaelli Jr. – Talvez porque enxaqueca seja a dor de cabeça que mais aflige e chama a atenção em virtude dos sintomas que a acompanham – intolerância à luz, ao barulho, vômitos, mal-estar geral – a palavra tenha-se transformado em sinônimo de dor de cabeça.
Enxaqueca é apenas um dos tipos de dor de cabeça e manifesta-se mais nas mulheres (80%) do que nos homens (20%). Na realidade, já foram descritos quase 200 tipos diferentes. O mais frequente é a cefaleia tensional episódica, a dor de cabeça comum que todo o mundo tem de vez em quando e não procura o médico por causa disso, e o pior deles, a cefaleia em salvas.
RELAÇÃO ENTRE ENXAQUECA E HORMÔNIOS FEMININOS
Drauzio – Existe alguma razão para as mulheres serem mais vulneráveis à enxaqueca?
Edgard Rafaelli Jr. – Minha teoria é que, sob o ponto de vista dos hormônios sexuais, o cérebro do homem funciona sempre na mesma toada: só produz testosterona. Já o das mulheres sofre duas modificações no mês. Durante quinze dias, produz estrógeno e, nos outros quinze, progesterona. Essa mudança constante afeta o sistema límbico, ligado às emoções, à memória e a substâncias que interferem na produção dos hormônios sexuais. É provável que essa seja a causa de as mulheres serem mais vulneráveis à incidência de enxaqueca. Já a enxaqueca em salvas, que tem sua origem hipotálamo, em 80% dos casos atinge mais os homens.
FUNCIONAMENTO DO SISTEMA LÍMBICO
Drauzio – O que é o sistema límbico e por que nesse local do cérebro está a origem da enxaqueca? 
Edgard Rafaelli Jr. – Assim como existe um cérebro pensante, existe um cérebro motor, que ouve, enxerga, tem memória. Todas essas divisões têm de estar em consonância entre si. Para que isso aconteça, é necessário existir uma espécie de computador central para reuni-las. Esse computador é o sistema límbico constituído por um mecanismo eletroquímico, que funciona através de conexões estabelecidas por substâncias chamadas neurotransmissores (neuro, porque pertencem ao sistema nervoso, e transmissores, porque são substâncias que uma vez elaboradas vão promover o funcionamento das mais diversas estruturas).
O sistema límbico coordena todos os neurotransmissores: a serotonina, a noradrenalina (geradora das crises de enxaqueca), a acetilcolina, a prostaglandina e a dopamina, entre outros. De sua organização funcional equilibrada resulta o funcionamento harmônico cerebral e corporal. Sob essa ótica, pode-se dizer que o hipocondríaco é um indivíduo que apresenta mau funcionamento do sistema límbico, má organização dos neurotransmissores e que, possuidor de uma sensibilidade exagerada, manifesta os mais diversos sintomas. Em vez de ser digno de pena ou de críticas, ele deve ser tratado por um neurologista que entenda do processo de neurotransmissão.
CEFALEIA EM SALVAS
Drauzio – Quais são as características da cefaleia em salvas? Como a pessoa pode identificar que está tendo uma crise desse tipo?
Edgard Rafaelli Jr. – A enxaqueca pode levar uma hora para atingir o pico da dor. Na cefaleia em salvas esse pico é atingido em cinco minutos. Os sintomas são típicos e inconfundíveis. É uma dor pulsátil, violenta, unilateral que se manifesta num dos olhos, na órbita ou no fundo do olho, que fica vermelho e lacrimejante. Outros sintomas são queda da pálpebra, congestão ocular, obstrução nasal e coriza na área comprometida.
Drauzio – Por que se chama cefaleia em salvas?
Edgard Rafaelli Jr. – Em inglês, a expressão para designar esse tipo de dor de cabeça é cluster headacheCluster significa concentração, aglomerado, agrupamento, por isso cluster headche era traduzido, na década de 1960, por cefaleia aglomerada, agrupada, em cachos, uma vez que cluster pode significar também cacho de uvas.
Eu não concordava com essa nomenclatura, mesmo porque não existe um correspondente perfeito para a palavra cluster em português. Procurei, então, uma característica da dor que pudesse ser usada para designá-la melhor.
A enxaqueca surge aleatoriamente. É uma crise que vem e passa, embora possa reaparecer noutro momento. Na cefaleia em salvas não é assim. As crises vêm agrupadas e são diárias (de uma a oito por dia) durante um período que vai de dez dias a três meses. Esse agrupamento de crises desaparece de repente e pode demorar bastante para manifestar-se de novo, o que acontece de uma hora para outra e sempre com as mesmas características de concentração. Isso me fez lembrar as salvas de tiros de canhão que, em determinadas ocasiões, interrompe o silêncio, dá 21 tiros e silencia outra vez. Achei que a palavra “salvas” descrevia bem esse tipo de dor de cabeça.
Drauzio – Como as cefaleias em salvas respondem aos analgésicos comuns?
Edgard Rafaelli Jr. 
– As cefaleias em salvas só respondem a analgésicos muito específicos. Na realidade, só respondem ao sumatriptano, que não é propriamente um analgésico, mas uma substância que atua diretamente sobre os receptores da serotonina. Se for injetada por via subcutânea no início da crise, em cinco minutos corta os sintomas.
Para esse tipo de cefaleia, não adianta prescrever comprimidos por via oral, porque eles demoram perto de 20 minutos para fazer efeito. Nesse tempo, a dor já atingiu um nível insuportável. Nos Estados Unidos, questionário aplicado em pacientes que tinham tido cefaleia em salvas, cólica de rins e cólica de vesícula, revelou que a cefaleia em salvas era considerada, por unanimidade, a pior das três dores, o que justifica ser também chamada de cefaléia suicida.
SÍNDROME DA CEFALEIA NA INFÂNCIA
Drauzio – Em que idade a enxaqueca se instala com mais frequência? 
Edgard Rafaelli Jr. – No nascimento. Enxaqueca não é dor de cabeça. É uma síndrome com no mínimo 60 sinais e sintomas dos quais a dor de cabeça é apenas um deles. Por isso, já na infância eles podem começar a aparecer. É o caso das crianças que choram sem motivo aparente, sentem dores abdominais inexplicáveis, dores nas pernas chamadas erroneamente de dores do crescimento, têm crises de asma ou bronquite que saram espontaneamente antes da puberdade, distúrbios de humor, terror noturno, manchas roxas nas pernas que surgem espontaneamente. Trata-se de manifestações para as quais não se encontra explicação neurofisiológica e a criança, a partir dos seis ou sete anos, começa a queixar-se de dores de cabeça que se vão avolumando até se tornarem insuportáveis na vida adulta.
Drauzio – Nas crianças, esses sintomas ocorrem obrigatoriamente?
Edgard Rafaelli Jr. – São obrigatórios. Se for feito um interrogatório retrospectivo a um portador de enxaqueca, encontraremos menção à maioria desses sintomas na infância. Por exemplo, a enurese noturna, que pode ser um problema de fundo psicológico, aparece em 20% dos pacientes com enxaqueca. Depois dos três anos de idade, fazer xixi na cama pode ser considerado patológico, mas 20% dos enxaquecosos urinam na cama até 12, 18 anos de idade, muitas vezes até depois de adultos, porque um descontrole do sistema límbico, da consciência e da bexiga provoca um relaxamento e a bexiga esvazia sozinha durante o sono.
Drauzio – Obrigatoriamente, as crianças que apresentam esse tipo de quadro vão desenvolver enxaqueca no futuro?
Edgard Rafaelli Jr. – Não obrigatoriamente. A pessoa pode passar a vida inteira tendo pequenos sintomas de disfunção límbica, ou seja, de uma síndrome em que o sistema límbico funciona mal, e nunca ter dor de cabeça.
ORIGEM DAS CRISES NA MEIA-IDADE
Drauzio – Será que as pessoas cujas primeiras crises de dor de cabeça se instalaram na meia-idade tiveram esses sintomas na infância?
Edgard Rafaelli Jr. – Tiveram. É comum ouvir falar de mocinhas – em geral, elas são mais susceptíveis – que desmaiam na igreja, em lugares fechados ou com grandes aglomerações. Por quê? Porque o portador de enxaqueca é muito sensível à queda de oxigênio no ar do ambiente. Por exemplo, uma igreja fechada, com centenas de indivíduos respirando e velas consumindo oxigênio, é o suficiente para o cérebro, que é muito sensível, desligar-se e a pessoa desmaiar. Portanto, se for feito um interrogatório sobre a vida passada dos pacientes que começaram a manifestar o problema aos 30 ou 40 anos, veremos que esses sinais sempre estiveram presentes. É interessante ressaltar também que, assim como a enxaqueca pode aparecer e piorar na menopausa, pode também ser curada nessa fase da vida. No entanto, em muitos casos, essa patologia é substituída pela labirintite, que faz parte do quadro e já dava sinais na infância. Crianças com cinetose, isto é, que enjoam, vomitam, sentem tontura quando andam de condução ou em brinquedos giratórios, já demonstram uma manifestação labiríntica.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA ENXAQUECA
Drauzio  Quais as principais características da cefaleia provocada pela enxaqueca?
Edgard Rafaelli Jr. – Na criança, a crise de enxaqueca pode durar de cinco a dez minutos; no adulto, de 4 a 72 horas. A dor pode manifestar-se em apenas metade da cabeça ou na cabeça inteira. Geralmente é uma dor latejante, acompanhada de intolerância à luz, cheiros, barulhos e ao movimento. Todos os sentidos ficam exacerbados durante a crise e qualquer estímulo extra constitui um tormento para o paciente que procura recolher-se num lugar escuro e quieto.
Drauzio – Pessoas com enxaqueca podem apresentar perturbações gástricas. Existe relação entre as crises de enxaqueca e certos distúrbios do aparelho digestivo?
Edgard Rafaelli Jr. – Nas crises de enxaqueca, há a liberação de noradrenalina e de dopamina. A noradrenalina chega a levar horas para promover o aparecimento de substâncias inflamatórias nas artérias do couro cabeludo – na verdade, o que dói na enxaqueca são exatamente essas artérias que apresentaram o processo inflamatório. A dopamina, ao contrário, provoca sintomas gástricos imediatamente, porque fecha a cárdia (válvula do estômago que conecta esse órgão com o esôfago) e o piloro  (válvula que conecta o estômago ao duodeno). Consequentemente, o estômago dilata e a pessoa não processa a digestão adequadamente. Esse desconforto causado pela dopamina costuma aparecer antes da dor de cabeça característica da enxaqueca e antes mesmo de surgirem os vômitos.
SINAIS PRECONIZADORES DA ENXAQUECA
Drauzio – Existem sinais que antecedem as crises de enxaqueca e que ajudam a identificar sua aproximação?
Edgard Rafaelli Jr. – Existem vários tipos de enxaqueca. Os mais importantes são a enxaqueca comum, hoje chamada de migrânea sem aura, e a enxaqueca clássica, ou migrânea com aura, que é bastante rara e representa apenas 1% dos casos.
Na migrânea com aura, existem sinais que preconizam a crise. O paciente tem distúrbios visuais: enxerga pontos pretos ou em ziguezague, somente a metade de um campo, ou fica cego de um dos olhos. Além disso, sente formigamento em um dos lados da boca, na metade da língua ou num braço e diminuição da força muscular. Esses sintomas duram de 10 a 30 minutos, cessam de repente e dão lugar a uma dor de cabeça tão forte que o indivíduo, que a sente pela primeira vez, imagina estar tendo um derrame ou ficando cego.
Na migrânea sem aura ou migrânea comum não existem esses fenômenos neurológicos e os sintomas que antecedem a crise dolorosa são mais tênues: sensação de fome, de empachamento no estômago, vontade de comer doces (porque há queda da serotonina), mudança de humor e mal-estar generalizado. Na verdade, a pessoa que sofre desse tipo de enxaqueca só percebe a aproximação da crise, quando a dor se instala e vai crescendo de intensidade até ficar muito forte.
USO DE ANALGÉSICOS PODE SER PREJUDICIAL
Drauzio – Qual é o momento certo para tomar analgésicos?
Edgard Rafaelli Jr. – Se a pessoa tem poucas dores de cabeça, uma ou duas crises de enxaqueca por mês, o ideal é tomar analgésico assim que pressente o início do processo doloroso. Agora, se as crises ocorrem 10 ou 15 vezes por mês, não se deve tomar analgésico algum. Por quê? Porque no sistema nervoso central (SNC) existem células que produzem substâncias que combatem a dor, chamadas de endorfina. O uso repetido de analgésicos atrofia o sistema produtor dessas substâncias e o paciente é obrigado a aumentar as doses de analgésicos, porque a dor de cabeça se torna cada vez mais intensa. Por isso, quando recebo alguém que está tomando analgésicos todos os dias, suspendo a medicação, pois é preciso desenvolver sua defesa natural para ajudar a combater a dor.
Drauzio – Como ele suporta a dor sem tomar analgésicos?
Edgard Rafaelli Jr. – O ser humano é muito resistente. Depois da Segunda Guerra Mundial, foram estudados soldados ingleses que sofriam de enxaqueca e que tinham estado em campos de concentração nazista. Nenhum deles tinha sofrido uma crise na prisão, porque o estresse violento provocado pelo medo de morrer, de ser morto, de adoecer, de não comer o suficiente, fazia com que produzissem endorfinas que os livravam dos episódios de dor de cabeça.
Drauzio – Como convencer uma pessoa com crises diárias de enxaqueca, que toma analgésicos e vai levando a vida, de que deve suspender a medicação e aguentar a dor?
Edgard Rafaelli Jr. – Parar de tomar analgésicos provoca um estresse tremendo semelhante ao dos soldados no campo de concentração, que resulta num aumento da produção das substâncias inibidoras da dor. Como consequência, durante algum tempo essas pessoas sofrem muito, mas depois ficam livres das fortes dores de cabeça.
TRATAMENTO PARA A ENXAQUECA
Drauzio – Ao contrário do que muitos pensam, existem tratamentos preventivos para a enxaqueca.
Edgard Rafaelli Jr. – Não só existem tratamentos preventivos, como a enxaqueca pode ter cura. Na realidade, há três possibilidades de tratamento. Numa primeira fase, é admissível prescrever analgésicos, se a pessoa tem uma ou duas crises não muito fortes nem muito prolongadas de dor de cabeça por mês. Na fase seguinte, o indicado é introduzir medicamentos preventivos que atuem diretamente sobre os neurotransmissores, pois em sua produção pode estar ocorrendo um erro para mais nos níveis de noradrenalina, ou para menos nos de serotonina. Antidepressivos, por exemplo, produzem aumento nos níveis de serotonina o que ajuda a diminuir a frequência e a intensidade das crises. A cura da enxaqueca, porém, está ligada à terceira fase do tratamento que visa ao combate de todos os sinais e sintomas que acompanham a dor de cabeça.
Drauzio – Como isso é possível?
Edgard Rafaelli Jr. – Veja o seguinte exemplo. Uma característica importante do portador de enxaqueca é a osmofobia, ou seja, a intolerância a determinados cheiros. É o caso da mulher que sente um perfume e imediatamente estoura de dor de cabeça. Mesmo que esteja respondendo bem ao tratamento e não esteja tendo crises, ao abraçar uma amiga que usa aquele perfume, descargas elétricas mediadas pelo nervo olfatório detonam novamente o processo doloroso. No entanto, existe um remédio específico para a epilepsia que pode ser indicado nesses casos, pois bloqueia essas descargas e mantém o nervo olfatório inalterado diante de cheiros fortes. Curar a osmofobia leva tempo. Só depois de quatro ou seis meses o paciente nota que realmente o cheiro deixou de incomodar e de provocar crises. Mesmo assim, a medicação ainda deve ser mantida por um ano. Depois disso, em geral o tratamento pode ser suspenso.
Drauzio – Por que se pede que os portadores de enxaqueca elaborem um relatório diário a respeito de suas crises e sintomas? 
Edgard Rafaelli Jr. – O cérebro do portador de enxaqueca recebeu uma herança genética que, sob determinados estímulos,  condiciona o aparecimento de uma descarga noradrenalina, neurotransmissor responsável pela liberação de substâncias inflamatórias que causam a dor. Como o tratamento da enxaqueca é cheio de nuances, uma medida fundamental é pedir ao paciente que preencha um relatório diário sobre suas crises e sintomas, a fim de caracterizar perfeitamente o quadro, pois não basta controlar as crises dolorosas. É preciso cuidar de todas as manifestações da síndrome: labirintite, distúrbios do sono ou viscerais, pesadelos, dores de estômago, etc.
Pacientes com enxaqueca apresentam, no mínimo, meia dúzia de sinais e sintomas que acompanham a dor. Se forem apenas ministrados analgésicos e remédios para agir sobre os neurotransmissores que provocam a crise, as dores melhoram, mas o paciente não fica curado.
GATILHOS DAS CRISES DE ENXAQUECA
Drauzio – Quais são os gatilhos que mais frequentemente disparam as crises de enxaqueca?
Edgard Rafaelli Jr. – Sem sombra de dúvida, o álcool encabeça a lista das coisas que disparam a crise de enxaqueca. Do vinho tinto, principalmente, os pacientes reclamam muito, embora bebidas destiladas também façam parte do rol das queixas. Existe, porém, um inimigo que, em geral, as pessoas desconhecem e custam a identificar: o açúcar. Como o controle da glicemia depende também do sistema límbico e o hipotálamo desses pacientes funciona mal, o metabolismo do açúcar fica comprometido. Uma vez que grande parte deles é hipoglicêmica , oscilações bruscas para cima e para baixo ou a falta de resposta aos níveis variáveis de açúcar no sangue são fatores importantes para deflagrar a crise.
Drauzio – Talvez seja difícil de reconhecer a ligação entre uma coisa e outra, porque o açúcar é um componente comum na dieta de todo o dia.
Edgard Rafaelli Jr. – Na verdade, ele faz parte da nossa vida. Nas décadas de 1970 e 1980, eu sempre pedia que os pacientes fizessem curva glicêmica, um exame aborrecido que obriga a pessoa a permanecer muito tempo no laboratório, tirando sangue em intervalos curtos. Depois, passei um período em que apenas recomendava suspender a ingestão de açúcar. No final, concluí que era muito difícil fazer alguém entender que ele podia ser prejudicial sem provar isso por meio da curva glicêmica e voltei a prescrever o exame.
Drauzio – Você corta o açúcar de todas as pessoas que têm enxaqueca?
Edgard Rafaelli Jr. – Não, obrigatoriamente. Se a curva glicêmica é normal, não há por que suspender o açúcar. Além disso, é necessário analisar cada caso separadamente. Chocolate, por exemplo, costuma ser um desencadeador de crises, mas existem chocólatras que preferem não fazer o tratamento a deixar de comer chocolate, pois garantem que esse alimento não lhes faz mal. Tudo é uma questão de bom-senso. Se não faz mal, podem continuar comendo. Caso contrário, devem suspender a ingesta desse alimento.
ENXAQUECA TEM CURA
Drauzio – Todos os casos de enxaqueca, desde que orientados adequadamente, têm cura ou há casos incuráveis?
Edgard Rafaelli Jr. – Existem algumas premissas a considerar. A primeira delas é que as crises de enxaqueca sejam muito antigas. Pode ser curada uma moça de 30 ou 40 anos, com uma história de 10 a 15 anos da doença. Já para uma senhora de 60 anos com história de 50 anos de dor de cabeça, não se fala em cura. Fala-se em amenizar os sintomas, em melhorar o quadro clínico. No entanto, em qualquer um dos casos, é fundamental redigir um diário relatando a evolução das crises e a resposta ao tratamento. Por exemplo, episódios aleatórios de enxaqueca podem sofrer mudanças e transformar-se em dor de cabeça em blocos, isto é, em cefaleia em salvas.
O cérebro acha que é sua obrigação produzir dor de cabeça e, se a atacarmos de alguma forma, irá buscar outro mecanismo de neurotransmissores para produzi-la. Por isso é importante tomar analgésicos com cautela e usar medicamentos que atuem não só sobre os neurotransmissores na medida certa, mas também sobre os outros sintomas. Agindo assim, será possível chegar à cura da doença.

Dor de cabeça

 visão geral

O que é Dor de cabeça?

Dor de cabeça é a dor em qualquer região da cabeça. As dores de cabeça podem ocorrer em um ou em ambos os lados da cabeça, serem isoladas em determinada localização, irradiarem pela cabeça de um ponto ou a outro, serem latejantes ou uma sensação de dor surda. As dores de cabeça podem aparecer gradualmente ou de repente, e podem durar menos de uma hora ou durante vários dias. Pelo menos 63 milhões de brasileiros de todas as idades sofrem com dores de cabeça frequentes.

Tipos

Existem mais de 200 tipos de dor de cabeça. Seus sintomas de dor de cabeça podem ajudar o médico a determinar a causa e o tratamento adequado. A maioria das dores de cabeça não é resultado de uma doença grave, mas algumas podem resultar de uma condição com risco de vida que requer cuidados de emergência. Dores de cabeça são geralmente classificados por causa:

Cefaleias primárias

Uma dor de cabeça primária é causada por problemas com hiperatividade ou a partir de estruturas sensíveis à dor em sua cabeça. A cefaleia primária não é um sintoma de uma doença subjacente - ou seja, a dor é o mal por si só. Entre os gatilhos para cefaleias primárias estão atividade química cerebral alterada e os nervos ou vasos sanguíneos de seu crânio contraídos ou os músculos da cabeça e pescoço contraídos. A dor de cabeça também pode ser causada por uma combinação desses fatores. Algumas pessoas podem carregar genes que os tornam mais propensos a desenvolver essas dores de cabeça.
As cefaleias primárias mais comuns são:
  • Cefaleia em salvas
  • Enxaqueca e enxaqueca com aura
  • Cefaleia tensional.
Há outros padrões de dor de cabeça que são geralmente considerados primários, mas são menos comuns. Essas têm características distintas, como uma duração incomum ou dor associada a uma determinada atividade. Embora essas dores de cabeça sejam geralmente consideradas primárias, cada um delas pode ser um sintoma de uma doença subjacente. Essas dores de cabeça incluem:
  • Cefaleia diária e crônica
  • Dor de cabeça associada à tosse
  • Dor de cabeça associada ao exercício
  • Dor de cabeça associada ao sexo.

Cefaleias secundárias

Uma dor de cabeça secundária é um sintoma de uma doença. Existem diversas condições que podem causar dor de cabeça, a depender da gravidade do problema. Fontes de cefaleias secundárias incluem:
  • Sinusite aguda
  • Coágulo de sangue (trombose venosa) dentro do cérebro
  • Aneurisma cerebral
  • Cérebro com malformação arteriovenosa ou uma formação anormal de vasos sanguíneos do cérebro
  • Tumor cerebral
  • Intoxicação por monóxido de carbono
  • Síndrome de Arnold-Chiari (malformação rara e congênita do sistema nervoso central)
  • Concussão
  • Desidratação
  • Problemas dentários
  • Otite
  • Encefalite
  • Arterite (inflamação do revestimento das artérias)
  • Glaucoma
  • Ressaca
  • Gripe
  • Rupturas de vasos sanguíneos no cérebro
  • Medicamentos para o tratamento de outras doenças
  • Meningite
  • Uso excessivo de medicação para a dor
  • Ataques de pânico
  • Síndrome pós-concussão
  • Pressão na cabeça por conta de chapéus apertados, capacetes ou óculos de proteção
  • Aumento da pressão no interior do crânio
  • Toxoplasmose
  • Neuralgia do trigêmeo.
Tipos específicos de cefaleias secundárias incluem:
  • Dor de cabeça por ingestão de líquidos ou sólidos muito gelados
  • Dor de cabeça causada por baixos níveis de líquido cefalorraquidiano, possivelmente o resultado de trauma, punção lombar ou anestesia raqui.

Causas

Existem diversos gatilhos para a dor de cabeça. Conheça as causas mais comuns:

Estresse

Sabe-se que o estresse libera doses dos hormônios adrenalina e cortisol, responsáveis por um aumento da frequência cardíaca. Isso pode causar dor de cabeça por conta de uma vasoconstrição dos vasos que irrigam a cabeça. A rotina estressante e a pressão da chefia podem ser a causa das dores constantes. A pressão, as cobranças e o medo de perder um cargo cobiçado geram mais estresse.

Muito calor

Um estudo realizado com sete mil pacientes do Centro Médico Beth Israel Deaconess, nos Estados Unidos, descobriu que a incidência de dores na cabeça causadas por enxaqueca, tensão ou outras causas aumenta cerca de 7,5% para cada 5°C a mais na temperatura. Além do calor, outros fatores ambientais como pressão, umidade e poluição do ar influenciam no aparecimento das dores. Isso ocorre porque o calor, ao facilitar a desidratação, desequilibra o processo de entrada e saída de sódio e potássio das células, causando um distúrbio metabólico que facilita a cefaleia.

Dormir mal

Dormir mal faz com que a quantidade do hormônio melatonina diminua. Esse hormônio ajuda a evitar o a dor, especialmente a enxaqueca, ao favorecer a síntese de analgésicos naturais. Além disso, quem dorme mal tende a sofrer mais com estresse.

Alguns alimentos

Se você tem enxaqueca, sofre de dores de cabeça facilmente, ou está com aquela dorzinha chata, evite os seguintes alimentos: chocolatecafé e chás pretos, embutidos, queijos amarelos, álcool, frutas cítricas, molho shoyo, cebola, alho e sorvete. Esses alimentos possuem substâncias que podem disparar o gatilho da dor. No caso do sorvete, há uma contração dos vasos, através da sensação de frio que o palato sofre. É como se o organismo estivesse dando um alerta para a diminuição repentina da temperatura.

Pular refeições

Ficar muito tempo sem comer pode causar hipoglicemia, ou seja, uma baixa nos níveis de açúcar no sangue. Essa baixa pode estimular indiretamente a liberação de adrenalina, que provoca a vasoconstrição, causando dor.

Postura incorreta

A má postura pode causar uma dor conhecida como cefaleia tensional. Os nervos da coluna acabam ficando comprimidos com a posição incorreta e a dor é irradiada para a cabeça. Além disso, no caso das dores crônicas, a causa pode ser uma hérnia de disco, cervical, bico de papagaio e osteoporose.

Esforço exagerado

Depois da academia e até do sexo, muita gente sente uma leve dor incômoda que, no caso de quem tem enxaqueca, pode ser até uma dor mais intensa. Existe uma causa conhecida pelos médicos como cefaleia pós-esforço. No entanto, essa dor de cabeça também pode ser indício de algo mais sério, como um aneurisma. O efeito também pode ser inverso - ou seja, o sedentarismo pode aumentar o risco de enxaqueca, uma vez que a prática de exercício regular, sem exagero, ajuda na vasodilatação, reduzindo os episódios de dor de cabeça.

Cheiros fortes

Não se conhece a fundo a relação entre alguns cheiros e a dor de cabeça, mas existem odores desencadeantes da cefaleia. Perfumes fortes, gasolina, solventes e cheiro de cigarro, quando em uma exposição prolongada, facilitam o aparecimento da dor de cabeça.

 prevenção

Prevenção

Os seguintes hábitos saudáveis podem diminuir o estresse e reduzir sua chance de ter dor de cabeça:
  • Dormir o suficiente
  • Ter uma alimentação saudável
  • Praticar exercícios regularmente
  • Aprender a postura adequada
  • Aprender a relaxar utilizando meditação, respiração profunda, yoga ou outras técnicas
  • Parar de fumar
  • Alongar o pescoço e a parte superior do corpo, especialmente se seu trabalho envolve digitar ou usar o computador
  • Usar óculos adequados, se necessário.

 diagnóstico e exames

Buscando ajuda médica

A dor de cabeça pode ser um sintoma de uma condição séria, tal como um AVC, meningite ou encefalite. Vá a um pronto-socorro ou ligue para a emergência se você estiver sentindo a pior dor de cabeça de sua vida, uma dor de cabeça súbita e grave ou uma dor de cabeça acompanhada por:
  • Confusão ou dificuldade para entender a fala
  • Desmaio
  • Febre alta, maior do 39 a 40 graus
  • Dormência, fraqueza ou paralisia de um lado do seu corpo
  • Torcicolo
  • Dificuldade para enxergar
  • Problemas na fala
  • Dificuldade para andar
  • Náuseas ou vômitos (se não claramente relacionada com a gripe ou uma ressaca).
Consulte um médico se sentir uma dor de cabeça que:
  • Ocorre com mais frequência do que o habitual
  • É mais grave do que o habitual
  • Piorar ou não melhorar com o uso adequado de analgésicos
  • Impedi-lo de trabalhar, dormir ou participar de atividades normais
  • For a primeira dor de cabeça que você teve na vida, mesmo que você tenha dores com frequência
  • Sua dor de cabeça vier repentinamente
  • Sua dor de cabeça piorar ao longo de um período de 24 horas
  • Sua dor ocorre por conta de uma lesão na cabeça
  • Você tem mais de 50 anos e suas dores de cabeça acabaram de começar, especialmente se também tem problemas de visão e dor ao mastigar
  • Você tem câncer e desenvolveu uma nova dor de cabeça
  • Gostaria de encontrar opções de tratamento que lhe permitem controlá-la melhor.

 tratamento e cuidados

Cuidados

Faça um diário da dor

Manter um diário da dor ajuda a encontrar a origem ou o que desencadeia seus sintomas. Dessa forma, você conseguirá encontrar algum hábito ou possível causa para o sintoma e então conseguir evitar. Quando uma dor de cabeça ocorre, escreva:
  • Dia e horário em que a dor de cabeça começou
  • O que você comeu nas últimas 24 horas
  • Quanto dormiu na noite anterior
  • O que estava fazendo e no que pensava logo antes de a dor de cabeça começar
  • Qualquer estresse em sua vida
  • Quanto tempo a dor de cabeça durou
  • O que você fez para a dor de cabeça parar.
Depois de um tempo, você pode começar a ver um padrão.

Tomando remédios para dor de cabeça em casa

Enxaquecas podem responder a medicamentos anti-inflamatórios não esteroides ou a medicamentos para enxaqueca que tenham uma combinação de drogas. Se remédios comuns não controlarem sua dor, converse com seu médico sobre possíveis medicamentos receitados.
Pessoas que tomam medicamentos para dor de cabeça regularmente por três ou mais dias por semana podem desenvolver superuso de medicamentos, ou cefaleias de rebote. Todos os tipos de analgésico (incluindo os vendidos sem receita) podem causar cefaleias de rebote. Se você acha que isso pode ser um problema, converse com seu médico.
Se você tem dor de cabeça frequentemente, seu médico pode receitar medicamentos para preveni-la. É importante tomar esses remédios conforme receitado, mesmo quando a dor de cabeça não aparecer.

Preveja uma crise

Quando o paciente apresenta sintomas visuais ou sensitivos antes da dor ele tem a chamada enxaqueca com aura. Essas sensações podem durar de poucos minutos até uma hora, seguidos de dor de cabeça muito forte. Entre os sinais mais comuns de enxaqueca com aura estão pontos brilhantes ou manchas escuras em forma de mosaico na visão e dormências ou formigamentos em apenas um lado do corpo. Mas mesmo as dores de cabeça sem aura podem ser premeditadas, pois o paciente pode ficar inquieto, sonolento, irritado ou eufórico, com desejo de comer comidas específicas, principalmente doces. Alguns pacientes apresentam sintomas até um dia antes da crise como bocejos e aumento de apetite. Nesses casos, você já pode se preparar melhor para a crise, cancelando compromissos e até mesmo iniciando o uso da medicação.

Entenda o que desencadeia sua dor de cabeça

Antes de sair seguindo os conselhos de parentes ou amigos que também sofrem de dor de cabeça, saiba que os gatilhos para uma crise são diferentes em cada pessoa, bem como os fatores que ajudam a amenizar os sintomas. Os desencadeantes de uma crise podem ser alimentos, estresse, alterações do sono, jejum, estado climático, alterações hormonais e muitos outros. Inclusive, algumas pessoas não possuem qualquer desencadeante específico. Por isso, o que melhora a crise para uma pessoa pode não ajudar em outra, cabendo a cada um prestar atenção em seus próprios agentes desencadeantes e o que pode ser feito para evitar ou amenizar a dor quando ela vier. Alguns dos tratamentos não medicamentosos mais comuns incluem compressas quentes ou frias, massagens, terapia de biofeedback, homeopatia e acupuntura.

Trate os sintomas separadamente

De todos os tipos de dores de cabeça, a enxaqueca é a mais rica de sintomas. Náuseas, vômitos, diarreia, sensibilidade à luz, cheiros, barulhos e movimentos, irritabilidade, sonolência e depressão são apenas alguns dos incômodos que podem acompanhar uma crise. Como o analgésico trata apenas a dor da enxaqueca, o paciente que tiver esses outros sintomas muito acentuadamente deve tratá-los de forma tópica. Esse cuidado é redobrado com aqueles que sofrem com vômitos, pois ele pode perder os analgésicos, precisando ir ao pronto socorro para receber drogas injetáveis. Quando o paciente relata vômitos intensos é conveniente medicá-lo com um antiemético conjuntamente com os medicamentos analgésicos - e alguns antieméticos parecem ter até um efeito sobre a dor.

Descanse em um local escuro e silencioso

Durante uma crise o paciente não suporta ambientes barulhentos e com muita luz, podendo esses fatores serem até mesmo desencadeantes do quadro. A pessoa com dor de cabeça pode ter anomalias neuroquímicas que tornam o seu cérebro mais "irritável" do que os outros, respondendo de forma exagerada a estímulos como luz e barulho. Assim, durante uma crise, o ideal é se sentar ou deitar - o que for mais confortável - em um local com pouca luz e sem barulhos, evitando ao máximo conversas e atividades que o tirem do repouso. Aqueles que possuem enxaquecas mais fracas podem melhorar completamente com o repouso, dispensando o uso de analgésicos.

Faça refeições leves e hidrate-se

Ainda que o desencadeante da sua crise não seja a alimentação, uma dieta leve rica em líquidos no momento da crise pode ser muito útil. Nos casos em que não há vômito, o jejum prolongado pode inclusive agravar a dor de cabeça. Beba muito líquido para se manter hidratado, tanto água quanto soluções hidratantes disponíveis no mercado. Porém, se o paciente estiver vomitando, o melhor é não ingerir alimentos sólidos e, em casos graves, procurar um pronto atendimento para receber medicações injetáveis mais potentes.

Se prepare nos dias de estresse

Apesar de existirem vários fatores desencadeantes de uma dor de cabeça, o gatilho mais importante é, sem dúvida, o estresse emocional. Situações como muitas horas no trânsito, cobranças no trabalho, excesso de horas trabalhadas e discussões familiares contribuem para que o cérebro do paciente produza mais noradrenalina, uma substância vasoconstritora que agravará ainda mais a dor de cabeça. Como é impossível fugir completamente do estresse e nem sempre é fácil evitá-lo, é importante que o paciente já esteja preparado para uma crise em dias que ele sabe que serão mais difíceis. Manter as medicações à mão, já fazer uma dieta mais leve e considerar sair mais cedo do trabalho, quando possível, são algumas alternativas.

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