Todo aluno de línguas já deve ter ouvido falar nestes três termos bastante utilizados nas pesquisas em Linguística Aplicada: método, metodologia e abordagem. Como um dos meus objetivos com o blog é tentar aproximar o aluno leigo das discussões teóricas e das pesquisas sobre ensino e aprendizagem de línguas, para que ele possa aproveitar essas informações no aprimoramento do seu processo de aprendizagem e também para que esteja mais bem preparado ao procurar um curso de línguas, tentarei explicar brevemente esses três termos.
Sei que o leitor deve estar achando três termos confusos, mas saiba que, mesmo nos textos teóricos, os termos método, metodologia e abordagem têm se mostrado uma confusão lexicográfica. Há vários autores que os utilizam com significados diferentes, e isso faz com que a utilização de um termo pelo outro ocorra com frequência no mercado de idiomas. Os três principais autores que utilizarei para explicar os conceitos são Anthony, Richards & Rogers e Brown.
Anthony define abordagem como sendo um conjunto de pressuposições relacionadas à natureza da linguagem, da aprendizagem e do ensino; e método como sendo um plano geral para apresentação sistemática da língua baseada em uma abordagem.
Já Richards & Rodgers reformulam o conceito de método proposto por Anthony chamando-o de abordagem. O que era método passa, portanto, a ser chamado de abordagem e método passa a designar um processo superordenado que engloba a abordagem, o desenho e o procedimento. Para eles, método é um termo abrangente que se refere à especificação e inter-relação da teoria e da prática.
Brown salienta que na literatura esses termos são utilizados, na maioria dos casos, com uma conotação que se aproxima mais das definições originais propostas por Anthony, sofrendo apenas alguns acréscimos importantes. Para efeito prático, as definições de Brown são as que tenho utilizado no meu trabalho como consultor de línguas. Assim, o termo metodologia é definido como o estudo das práticas pedagógicas em geral, incluindo questões teóricas e pesquisas relacionadas a essa prática. Abordagem é o conjunto de posições e crenças teóricas sobre a natureza da linguagem e da aprendizagem de línguas, e da aplicabilidade de ambas a contextos pedagógicos.Método é um conjunto generalizado de especificações de sala de aula para atingir objetivos linguísticos determinados, englobando, principalmente, os papéis e o comportamento do professor e do aluno.
Gosto muito de ressaltar na definição de método o que destaquei em itálico acima. Embora o mercado de idiomas em geral reduza o método ao livro didático, percebemos, na prática, que em uma aula de línguas, que é um contexto de interação social, o comportamento do professor e do aluno deve ser o grande foco de um excelente método de ensino.Durante anos, professores de línguas adotaram, adaptaram, inventaram e desenvolveram uma desnorteadora variedade de termos para descrever as atividades nas quais eles se engajam e as crenças que possuem. Sendo alguém envolvido com o ensino de inglês como língua estrangeira por quase vinte anos, às vezes me sinto sobrecarregado com a sobreposição de terminologias que permeiam essa área. Falamos e escrevemos sobre a abordagem áudio-oral e o método áudio-lingual; a abordagem da tradução; o método direto; o método de mímica e memorização (mim-mem); técnica de prática de padrões; método gramatical e até mesmo método natural ou “método da natureza” da pedagogia do ensino de línguas. Todavia, para o meu próprio trabalho, achei necessário e frutífero impor uma sistematização aos três termos no léxico do ensino de línguas. Talvez seja útil que os leitores da área de ensino/aprendizagem da língua inglesa (ELI) considerem essas três novas definições.
Pode se constituir num empreendimento vantajoso tentar limitar o uso de alguns termos quando nos referimos profissionalmente a conceitos ligados ao ensino de línguas. Assim, se ao discordarmos sobre formas de ensinar línguas pudermos nos referir a um quadro sobre o qual temos concordância, e focarmos claramente as distinções entre pontos de vista poderemos, então, ser capazes de determinar em quais áreas os defensores de vários sistemas de ensino de línguas empregam os mesmos termos diferentemente e onde nós usamos uma terminologia diferenciada em situações que são essencialmente as mesmas. Nós poderemos também descobrir que professores de línguas não os diferenciam tanto quanto até agora se supôs. Conseqüentemente, as definições abaixo são apresentadas como um sistema de complemento pedagógico dentro do qual, muitas idéias, opostas ou compatíveis, poderão ser guardadas.
A tríade de termos que estou tentando reposicionar no esquema de definições é composto de abordagem, método e técnica. A organização é hierárquica. A razão para esta organização é que as técnicas executam um método que é consistente com umaabordagem. As definições são oferecidas com alguma modéstia – existem muitos caminhos para o Nirvana, e esta certamente não é a única rota. Nem todos os aspectos do ensino de línguas foram mencionados nesta estrutura. É bem possível que modificações e melhorias sejam ainda bem-vindas mais adiante.
Primeiramente, vamos tomar o termo abordagem. Vejo uma abordagem, qualquer abordagem, como um conjunto de pressupostos correlacionados tratando da natureza da língua e da natureza do ensino e do aprendizado de línguas. Tal abordagem é axiomática e descreve a natureza do assunto a ser ensinado. Ela afirma um ponto de vista, uma filosofia, uma fé – algo no qual alguém acredita, mas que não necessariamente pode provar. Freqüentemente ela é indiscutível, exceto quanto à eficácia dos métodos que surgem dela.
Deixem-me ilustrar citando pontos essenciais da abordagem áudio-oral como eu a vejo. A intenção não é a de defender esses referentes detalhadamente agora, mas somente exemplificar o significado de abordagem. Segue aqui uma lista de pressupostos lingüísticos:
- Uma língua é humana, áudio-oral e simbolicamente significativa.
- Toda língua é estruturada de maneira única. Isto também pode ser colocado negativamente: duas línguas nunca serão estruturadas igualmente.
- A estrutura da língua pode ser descoberta e descrita útil e sistematicamente ainda que tais descrições possam se diferenciar em vários níveis e para vários propósitos.
Se a língua for aceita como áudio-oral, um corolário óbvio dessas suposições é o de que a escrita é uma manifestação secundária e fundamentalmente baseada na fala. No entanto, preciso dizer imediatamente que esta não é necessariamente uma afirmação da importância relativa da fala e da escrita. Pode-se, certamente, argumentar que a escrita é geralmente mais deliberada e cuidadosa do que a fala, e sempre mais permanente do que a última, tornando-a, portanto, mais importante.
O segundo tipo de pressuposição – aqueles relacionados com o ensino/aprendizagem da língua – toma a forma de duas afirmações prioritárias; uma afirmação de procedimento, e uma de comparação, todas resultantes de pressupostos lingüísticos.
1. Manifestações primárias (os aspectos áudio-orais) devem ser ensinadas antes das secundárias (leitura e escrita). A compreensão da linguagem oral é ensinada mais eficientemente antes da produção oral, e é de fato o primeiro passo em direção à produção.
2. As manifestações secundárias (os aspectos de leitura e escrita) devem ser ensinadas na ordem estabelecida, uma vez que os símbolos gráficos devem ser vistos antes de serem produzidos, assim a leitura, de certa forma, é realmente o primeiro passo para se aprender a escrever.
3. Outros usos da língua – terciários nesse esquema – tais como manifestações literárias e artísticas, pedagogicamente também seguem a ordem recepção/produção. Talvez seja questionado se alunos estrangeiros de inglês devam ser instruídos na produção de inglês literário.
4. Nossa suposição de procedimento afirma que (a) línguas são hábitos, (b) hábitos são estabelecidos por repetição, e (c) línguas devem ser ensinadas a partir de algum tipo de repetição.
5. Uma suposição que não é sempre aceita, e sobre a qual há atualmente muita discussão, gira em torno da utilidade da comparação bilíngüe: conforme já dissemos, cada língua é estruturada de forma singular. Logo, é benéfico comparar a língua do aprendiz com a língua-alvo para isolar aqueles aspectos da língua-alvo que podem ser prognosticados, com certo grau de precisão, como causadores de problemas para o aprendiz.
Vamos então para nossa segunda definição – a de método. O método é um plano global para a apresentação ordenada do material de linguagem. Nenhuma parte dele contradiz e ele se baseia na abordagem selecionada. A abordagem é axiomática, ométodo é procedimental.
Dentro de uma abordagem pode haver muitos métodos. Vários fatores influenciam a apresentação ordenada da língua aos alunos. A ordem será influenciada pela natureza da língua do aluno comparada ao inglês. Ensinar inglês a falantes de chinês é metodologicamente distinto. A idade do aluno, sua bagagem cultural e sua experiência prévia com o inglês modificam o método empregado. A experiência do professor e seu nível de domínio da língua inglesa são significativos. Deve-se levar em conta se o objetivo do curso é a leitura, a fluência na fala ou a assimilação de técnicas de tradução. Todos esses fatores modelam a metodologia. Importa também saber qual é a importância da língua inglesa no currículo do aluno e o tempo disponível para o seu estudo.
Conforme pudemos ver acima, os livros didáticos deveriam ser escritos dentro de certas demarcações metodológicas.
Talvez valha a pena comparar rapidamente dois métodos que partilham uma mesma abordagem. A abordagem, mais uma vez, é a áudio-oral. Os métodos são freqüentemente chamados de mim-mem (mímica e memorização) e de prática de padrões. Ambos compartilham o mesmo fator ‘objetivos’: visam à produção oral automática associada à habilidade de compreensão do fluxo do discurso. Cada um deles funciona melhor no formato de curso intensivo. Ambos são principalmente voltados a adultos e nenhum dele por si mesmo pressupõe experiência prévia de aprendizagem. Contudo, a ordem de apresentação se diferencia.
O método mim-mem (ou seja, de mímica e memorização) começa com uma dada situação – talvez com cumprimentos, ou comida e refeições ou ainda como conseguir um quarto num hotel. O estudante deve imitar o falante nativo, real ou gravado, e se lembrar de um grande número de frases que sejam úteis à situação. Das frases memorizadas são retiradas certas estruturas, fonológicas e gramaticais, para que se tornem focos de ênfase e de exercícios de repetição (drills). A escolha dessas estruturas depende idealmente do resultado de descrição e análise bilíngües. Não há nada no método da mímica e memorização que contradiga os pressupostos que compõem a abordagem áudio-oral.
Por outro lado, o método da prática de padrões idealmente utiliza a comparação bilíngüe desde o princípio, começando com estruturas gramaticais e fonológicas escolhidas a partir dos resultados da comparação de pontos entre as duas línguas. Essas estruturas são repetidas e desenvolvidas numa situação através da adição de itens lexicais. Mais uma vez, não há nada aqui que contradiga a abordagem áudio-oral. Ambos os métodos têm sido utilizados com sucesso. Ambos se apóiam na mesma abordagem, apesar de cada um ostentar características distintivas.
O último termo a ser discutido é técnica. Uma técnica é algo que se implementa – é aquilo que de fato acontece na sala de aula. É um truque específico, um estratagema ou um artifício utilizado para se atingir um objetivo imediato. As técnicas devem ser consistentes com um método e, por conseguinte, estar em harmonia com uma abordagem.
As técnicas dependem do professor, da sua perícia individual e da composição da turma. Problemas específicos podem ser atacados com o mesmo sucesso mediante o uso de técnicas distintas. Por exemplo, ao ensinar a diferença na pronúncia do /l/ e do /r/ do inglês a alguns alunos orientais, os professores às vezes conseguem bons resultados ao pedir simplesmente imitação. Se a imitação falhar, uma outra técnica requererá o uso de um lápis na boca para evitar que a língua do aprendiz toque a parte da frente do céu da boca, inibindo, assim, a pronúncia do /l/. Um outro professor, ou até o mesmo professor em outro momento, pode recorrer a um desenho ou quadro ilustrativo do aparelho fonador humano.
Quando visitantes observam uma aula, o que eles predominantemente vêem são técnicas. Os professores quase sempre não se sentem à vontade na presença de observadores, temendo uma má interpretação de suas aulas. Na minha visão, isto se origina de uma confusão entre técnicas e método. A eficácia de uma técnica em particular deve ser considerada em relação a um método. Uma técnica específica pode ser utilizada erroneamente no andamento de um curso por estar fora da ordem exigida pelo método. Mais adiante no andamento da aula, ela poderá se mostrar totalmente acertada.
Gravadores e toca-fitas de laboratório são técnicas. As máquinas de ensino/aprendizagem recentemente tornadas populares são técnicas. O circuito fechado de tevê do Instituto de Língua Inglesa da Universidade de Michigan é uma técnica. E até mesmo o avião que vagarosamente sobrevoa em círculos o meio-oeste estadunidense transmitindo sinais de tevê educativa é, por essa classificação, uma técnica quadrimotor.
Recentemente as máquinas têm recebido muita atenção. Muitas alegações têm sido feitas a favor de sua eficácia no ensino de línguas. De fato, elas são de grande valia, mas seu valor depende do método e da abordagem. O fator operante no uso dos laboratórios de línguas não se deve ao número de cabines nem à modernidade dos equipamentos eletrônicos, mas sim ao tipo de abordagem adotado e ao método que o equipamento executa. Uma máquina de ensino/aprendizagem, por mais complexa que seja, é uma técnica. Os princípios de incremento gradual de fatores de aprendizagem estão na esfera da abordagem e o programa em si desenvolvido num curso descreve o método.
Espera-se que os três termos aqui focalizados, isto é, técnica, método e abordagem, redefinidos e empregados de acordo com as noções ampliadas descritas acima, sirvam para diminuir um pouco a confusão terminológica existente na área de ensino de línguas. Comentários e críticas relativas ao uso dos referidos termos serão bem recebidos por este autor.
Edward M. Anthony foi chefe do Departamento de Linguística Geral e diretor do Instituto de Língua Inglesa da Universidade de Pittsburgh na costa leste dos Estados Unidos. Ele escrevia a partir de uma bagagem rica de experiências como professor consultor e gestor de vários programas e organismos voltados para o ensino de inglês como segunda língua ou língua estrangeira nos Estados Unidos da América e em outros países. O Dr Anthony esteve, por duas décadas, atrelado ao desenvolvimento de programas de língua inglesa na Tailândia, Afeganistão e Japão. No início da década de 70, o Prof. Anthony serviu como coordenador do Projeto para a Melhoria do Ensino de Inglês nas universidades tailandesas. O Professor Anthony desempenhou papel de protagonismo no movimento TESOL (Teachers of English to Speakers of Other Languages - Professores de Inglês a Falantes de Outras Línguas), que ele fundou oficialmente em 1966.
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[1] Nota da tradução: Este artigo seminal foi originalmente publicado por Edward M. Anthony na revista English Language Teaching (ELT), vol. 17 (p. 63-67), 1963. Mantivemos os grifos originalmente feitos pelo autor assim como a organização do texto. Permissão para publicação concedida por Journals Permissions/Oxford Journals através da ordem < Ref:/FP/260501/Filho/ELT Ref:/MI/230501/Filho/Jur> obtida em 01/06/2010.
[3] Note-se que nenhuma afirmação é feita a respeito do tamanho da porção da língua falada que deve ser apresentada antes que a produção oral comece.
[4] Ordem estabelecida pelo autor no documento original.Abordagem seria uma tática naval de combate, quando duas ou mais naves se aproximam uma das outras para que seus combatentes de uma delas ou das demais, simultaneamente, entrem em combate corpo a corpo. A abordagem é também utilizada pelos piratas e corsários em abordagens e pilhagem de navios para logística ou mercante, sem escolta.
Havia muitas táticas para invadir um navio. Às vezes, homens se vestiam de mulheres para que o navio fosse salvá-las, e fossem atacados. Havia vezes que eles trocavam a bandeira de pirata por uma do país correspondente ao navio que queriam abordar, e fingiam pedir socorro, quando os outros viessem ajudar, seriam abordados, roubados e muitas vezes mortos.
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