O médico Luís Meira, que dirige o departamento de formação em emergência do INEM, vai substituir o presidente Paulo Campos enquanto decorrer o processo disciplinar que lhe foi instaurado pelo ministro da Saúde e que implica a suspensão temporária de funções, confirmou o PÚBLICO.
O ministro da Saúde seguiu as recomendações da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS), que sugeriu a abertura de um processo disciplinar a Paulo Campos, por ter concluído que a sua actuação foi ilegal e contrária ao interesse público no caso do accionamento de um helicóptero para transporte de uma doente do hospital de Cascais para o de Abrantes, em Janeiro deste ano.
Luís Meira está no INEM há muitos anos, já dirigiu a delegação regional do Norte do instituto e esteve à frente do CODU (Centro de Orientação de Doentes Urgentes). “Se se confirmar que é o Dr. Luís Meira, esperamos que venha com vontade de unir novamente os trabalhadores, de falar com eles e de os respeitar. Ele é uma pessoa da casa e isso é fundamental”, comentou Rui Gonçalves, da Comissão de Trabalhadores do INEM.
"O que queremos é paz na casa, estabilidade para trabalhar e que seja limpa a má imagem criada", corroborou Ricardo Rocha, presidente do Sindicato dos Técnicos de Ambulância de Emergência, notando que a actual situação é "sui generis". "O INEM vai ficar com um presidente interino?", pergunta.
Esta manhã também, o gabinete de marketing e informação do INEM fez saber que a conferência de imprensa marcada para o início da tarde por Paulo Campos foi desmarcada “por motivos imprevistos”. Segundo a assessora de imprensa do INEM, Ivone Ferreira, a meio da tarde ainda não havia a confirmação oficial do nome de Luís Meira para substituir Paulo Campos, que, aliás, também não tinha ainda sido notificado oficialmente da suspensão temporária.
Numa nota à comunicação social divulgada terça-feira à noite, Paulo Campos saudou "a tomada de uma decisão, ao fim de largos meses de invenções, desinformações, especulações e fugas de informação que apenas visaram este resultado" e assegurou que "todo este processo radica numa mentira ignóbil, como a seu tempo ficará provado”.
Em anexo à nota, tornava pública uma carta que escreveu há dias ao ministro da Saúde, após a divulgação de notícias sobre o relatório da IGAS. Nesse texto com três páginas, o presidente do INEM frisa que apenas quis salvar uma doente "perdida" num serviço de urgência de um hospital do SNS "incapaz de dar resposta às necessidades da população que devia servir adequadamente". Uma doente que não estava em estado terminal, ao contrário do que tem sido afirmado, acentua.
É uma carta extremamente dura. Paulo Campos considera que o episódio do helicóptero é apenas um exemplo das "fragilidades do sistema de saúde" que Paulo Macedo dirige. Fragilidades que, frisa, "colocam em risco várias vidas, designadamente por ineficiência do sistema, nomeadamente nos serviços de urgência".
Insistindo que não actuou "em benefício pessoal", nem tem uma relação de amizade com a família da doente, garante que o INEM, as equipas médicas e ele próprio têm "a certeza" de, neste caso concreto, terem "cumprido escrupulosamente a missão" de que estão legalmente incumbidos.
Conta que a doente foi transportada inicialmente por uma viatura de emergência médica do INEM e entrou no sistema “via 112” e explica que foi na sequência de "uma reclamação da família" para o instituto que actuou, tendo outro médico intensivista concordado com a sua estratégia. Na carta, Paulo Campos lamenta, aliás, que nem este médico nem os enfermeiros do INEM que o acompanharam naquele dia tivesse sido ouvidos pela IGAS, tal como a família da doente.
Mas vai mais longe, ao considerar que, se todos tivessem agido “com indiferença e imobilismo”, estariam hoje acusados de homicídio involuntário, “por ter havido atraso irremediável do tratamento configurado no conceito jurídico de ´perda de chance´”, aludindo a um acórdão do Tribunal Cível de Lisboa que condenou um hospital privado a pagar uma indemnização à família de uma doente que ali morreu com uma infecção que terá sido diagnosticada tarde demais.
Para a IGAS, a conduta do presidente do INEM foi “contrária aos princípios gerais da ética e da boa gestão”. E isto porque, enfatiza a inspecção, “em função de um apelo particular, foi privilegiada uma doente sem que tal excepção fosse devidamente fundamentada e autorizada”.
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