O chinelo é um tipo de calçado aberto, feito de borracha, PVC, couro, palha, tecido ou outro material. Possui o formato aproximado do contorno de cada um dos pés. A palavra "chinelo" vem do latim medieval *planella, de planus,-a,-um 'plano', segundo Corominas, talvez por influência do dialeto genovês cianella (it. pianella, dim. de piano 'plano').
Alguns chinelos apresentam uma tira bifurcada com origem entre o dedão e o indicador do pé e que se estendem aproximadamente por 11 centímetros até as laterais do pé. Outros chinelos são formados apenas por uma tira, de largura variável, que passa sobre o peito do pé.
Muitas vezes os chinelos são calçados de uso doméstico, durante os dias quentes, especialmente no verão, ou como acompanhamento do traje de dormir. Pode também compor parte do traje de banhistas, na ida à praia ou na beira da piscina. Nada impede, porém, que também sejam usados socialmente.
É um importante calçado no contexto de moda dia a dia, principalmente em cidades litorâneas e com clima quente. Suas principais características são os dedos de fora, sem salto (com salto seria uma sandália), e com ou sem tiras no tornozelo. Também são chamadas de rasteiras.No mês de maio de 2012, enquanto eu redigia este texto, recebi um email de
uma querida amiga, também historiadora e professora, desejosa de dividir com outros
colegas uma notícia que lhe chamara a atenção. Marly Motta, numa manhã qualquer,
ocupada com outros afazeres, ouvira pela rádio CBN – “a rádio que toca notícia” –, um
filólogo explicar o significado da palavra ócio. Ele ensinava, recorrendo ao saber de sua
disciplina, que longe de querer dizer desocupação ou não ter o que fazer, o que lhe dava
uma conotação um tanto negativa, a origem grega da palavra demarcava uma idéia bem
diferente: a de ser livre para escolher fazer aquilo que se gosta. Assim, o espaço do ócio
era o da liberdade de escolha da ação, do prazer de realizar algo e, por isso, seguindo
Marly, na esteira do narrador, vinha a “surpresa”: fora a palavra ócio que dera origem à
palavra escola, exatamente porque ela deveria ser o espaço para o livre pensamento,
para a criatividade das crianças e dos jovens, enfim, para que nela eles aprendessem a
fazer o que caracteriza a humanidade: pensar.
Começar o texto com essa historieta é um raro privilégio. Ela me conta, em
2012, como o rádio mantém seu poder de informar e divertir um amplo e diversificado
público, entrando em suas casas e convivendo amigavelmente com modernas
tecnologias, inimagináveis nos anos 1950, quando a minha história vai se passar. Tratase
de uma notícia curta (eu confirmei com Marly), que tem um foco bem determinado e
que consegue interessar o ouvinte, na medida em que o surpreende por meio de um
evento, no caso lingüístico, pequeno, mas cheio de desdobramentos. Nesse caso, a
palavra ócio é exatamente o contrário do que a vã filosofia diz que ela é; para uma
professora, como eu e Marly, que, ao longo de nossas vidas, convivemos com alunos de
todas as idades, entender a escola e o ensino de história nessa chave semântica, é uma
descoberta prazerosa. Ou seja, e já adentrando à minha reflexão, a história da palavra
escola, narrada de forma interessante, envolve: o rádio como mídia; sua possibilidade de
ensinar algo valioso e divertido; e uma estratégia de fazê-lo em poucos minutos, através
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de historietas que exploram a curiosidade dos ouvintes. Eles, por isso, fixam o sentido
principal do que lhes foi transmitido e, como Marly, provavelmente compartilham a
notícia, divulgando-a por outras mídias, tornando-se novos mediadores no processo
desencadeado pela CBN.
Tomando cuidado para não incorrer no pecado mortal de anacronismo, meu
objeto de análise neste texto tem exatamente essas características principais. Guardadas
as marcas presentistas da escrita da história, ele começa destacando, como passados
mais de 70 anos, elementos de uma matriz discursiva para se ensinar algo de interesse
para o grande público, por meio de mídias – como periódicos, rádio, TV etc –, podem
guardar constantes que nos incitam a refletir sobre a duração de estratégias narrativas de
teor pedagógico, traduzidas, de forma densa, na noção de curiosidade. Não,
evidentemente, aquela curiosidade que pode matar o gato, mas sim a que prende a
atenção do público, partindo de algo simples e pequeno, para, ao final, surpreendê-lo de
alguma maneira, seja essa surpresa um tanto cômica, um tanto trágica, ou apenas
“curiosa”. Enfim, curiosidade é uma categoria boa para pensar a minha história dos
anos 1950.
Mas, seguindo um pouco do que aprendi na pesquisa e desejando deixar o leitor
curioso, dividi o texto em duas partes. Na primeira, apresentarei o objeto que analiso.
Um programa de rádio que vai ao ar entre 1952 e 1955, situando as condições de sua
produção na emissora que o abriga, para que o leitor possa situá-lo como um importante
instrumento de divulgação de uma narrativa da história, cujo autor era jornalista,
teatrólogo, literato e professor, mas não um “historiador de ofício”, embora Viriato
Corrêa, esse era o seu nome, fosse apresentado pela rádio como tal. Na segunda parte,
discutirei os conteúdos veiculados nas emissões, mas, principalmente, estarei atenta às
estratégias narrativas para apresentação de tais conteúdos. Evidentemente, nem este
texto, nem a pesquisa já realizada, esgota a riqueza e multiplicidade de questões que tal
prática cultural de escrita/audição da história possibilita. Mesmo assim, ela permite o
teste de minha hipótese principal, que é defender que tal programa, considerando seu
autor e veículo, me permite discutir uma matriz de escrita da história destinada a um
grande público (uma história ensinável, como a tenho chamado), cuja estrutura narrativa
estava praticamente consolidada nos anos 1950, sendo compartilhada por outros
intelectuais do período e apropriada em novas modalidades, ultrapassando o século XX.
Por isso, escolhi a categoria curiosidade como guia para pensar as estratégias
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discursivas de tal matriz, até porque o autor do programa intitulou-o de História de
chinelo: série de interessantes curiosidades históricas.
2- A “campeã de audiência” e o ensino da história, ou como uma rádio
comercial também cumpre uma função educativa
História de chinelo: série de interessantes curiosidades históricas estreou, na
Rádio Nacional, em 14 de março de 1952, ficando no ar até setembro de 1955, o que
cobre um período de um pouco mais de três anos consecutivos. Era um programa diário,
só não sendo irradiado aos domingos o que, evidentemente, podia sofrer algumas
variações ao longo desses anos. O programa era curto, tendo precisos cinco minutos de
duração, indo ao ar às 21:30 horas, o que explica o nome da atração que o substitui em
1955: Programa das nove e meia. Isso significava que ele se inseria no horário
considerado nobre das rádios, algo que cobria as irradiações que decorriam entre 20 e
22 horas. Por tal razão, seu público era fundamentalmente adulto, mas não
preferencialmente apenas feminino, pois os homens já estariam nas casas após voltarem
do trabalho.
Seu autor era, como se disse, Viriato Corrêa, então um senhor com 68 anos de
idade, integrante da Academia Brasileira de Letras desde 1938, e possuidor de uma
produção intelectual na área da literatura infantil e do teatro muito numerosa e
reconhecida, cujo maior destaque era o livro Cazuza (1938). Nessa produção se destaca,
claramente, uma intenção e preocupação com o ensino de história, especialmente da
História do Brasil, evidenciadas em títulos de livros para adultos (O Brasil dos meus
avós: crônicas da história brasileira, São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1927),
livros escolares (História do Brasil para crianças, da mesma editora,1934) e peças
históricas, como A Marquesa de Santos (1938) e Tiradentes (1941), entre inúmeros
outros exemplos. O autor, portanto, vinha publicando esse tipo de trabalhos,
sistematicamente, desde os anos 1920, sendo também um assíduo colaborador de jornais
e revistas, a partir dos anos 1910, quando se muda para o Rio de Janeiro. Nesses
periódicos ele escreveu matérias e manteve colunas, dirigidas a um público infantil,
como o “Fafazinho” da Gazeta de Notícias, em 1907/8; “Gaveta de Sapateiro”, voltada
para adultos, no Jornal do Brasil, entre 1931 e 1935; e “Teatro”, em A Manhã, jornal
oficioso do Estado Novo, nos anos 1940. O que se deseja remarcar com essas rápidas
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menções à trajetória intelectual de Viriato Corrêa é que, em início da década de 1950,
ele já possuía uma “coleção” de livros e peças históricos, que evidencia seu aprendizado
de um tipo de escrita da história de teor cívico-patriótico, que vinha se desenvolvendo
desde as primeiras décadas do século XX, pari passu aos debates sobre a modernização
da educação brasileira e a cientificidade e “utilidade” da história, para a construção de
uma nação republicana. Sua narrativa estava madura, pois já fora devidamente testada
por um público de leitores e es de várias idades e por um período de mais de três
décadas.
Pode-se observar, inclusive, que, nos anos 1950, ele não publicou muito, se
compararmos sua atividade de autor com aquela desenvolvida nos anos 1930/40: apenas
um livro, sugestivamente intitulado Curiosidades da história brasileira (São Paulo,
Companhia Editora Nacional, 1955), certamente um desdobramento do programa de
rádio que fazia; e a peça O grande amor de Gonçalves Dias, de 1959, publicada pela
editora Civilização Brasileira do Rio de Janeiro. Nos anos 1960, bastante idoso e
doente, publica igualmente um único livro, de grande sucesso, História da liberdade do
Brasil (Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1962), tanto que se transforma em enredo
da Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, em 1967, ano de sua morte.1
Além
desse trabalho dirigido às crianças, e para se ter uma idéia da posição que ocupa no
campo literário, participa de uma obra coletiva, O mistério dos MMM (Rio de Janeiro,
Gráfica O Cruzeiro, 1962), coordenado por João Conde, que contava com a presença de
Jorge Amado, Guimarães Rosa, Dinah Silveira de Queiroz, Lucio Cardoso, Raquel de
Queiroz Antônio Callado e Orígenes Lessa, por exemplo.
Assim, ao assinar o programa da Rádio Nacional, dispunha de vasta experiência
como literato, como teatrólogo e como divulgador de conhecimentos históricos. É
minha hipótese que seu envolvimento com a História foi gradual, crescente e duradouro,
sendo marcado pela escolha consciente, continuamente testada e aperfeiçoada, da
produção de narrativas voltadas para as crianças e para o “povo”, isto é, para um grande
público, visando explicitamente sua educação cívica. Por essa razão, pode ser
entendido, de forma paradigmática, como um mediador cultural, ou seja, como um
intelectual que desempenha uma função estratégica para o estudo da construção de
memórias nacionais e da formação de culturas históricas, nesse caso, de uma cultura
1 Trabalhei com esse livro em GOMES, Angela de Castro e CAVALCANTE, Vanessa. “História da
liberdade no Brasil, ou quando uma história acaba em samba”. ROCHA, Helenice A. B., REZNIK, Luís e
MAGALHÃES, Marcelo. A História na escola: autores, livros e leituras, Rio de Janeiro, Ed. FGV
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