A despeito do caminho inicialmente percorrido pela doutrina e pela jurisprudência, outra linha de pensamento ganhou força no meio jurídico, tendo sido traçado um raciocínio paralelo ao consubstanciado no enunciado n. 609 das súmulas do Supremo Tribunal Federal. Houve o surgimento do artigo 83 da lei federal nº 9.430/96 e o questionamento acerca da mitigação da independência das instâncias administrativa e penal.
Em 27 de dezembro de 1996, nasceu a lei federal nº 9.430/96 dispondo sobre modificações na legislação tributária federal, sobre contribuições para a seguridade social, sobre o procedimento administrativo de consulta, dentre outras providências. Junto com a novidade instituída pelo seu artigo 83, inúmeros outros questionamentos surgiram abordando o real alcance deste dispositivo e sobre a sua influência na consagrada independência então existente entre as esferas administrativa e penal. Vejamos o termo literal da norma:
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária definidos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, será encaminhada ao Ministério Público após proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente.
Muitos doutrinadores argumentaram que este texto havia produzido uma clara mitigação da independência das instâncias administrativa e penal, uma vez que a citada representação fiscal apenas poderia ser encaminha após a decisão final na esfera administrativa sobre a exigência fiscal do crédito tributário.
O Procurador Geral da República ajuizou uma ADI perante o Supremo Tribunal Federal sob a alegação de que a dependência entre as duas instâncias violaria o art. 129, I da Constituição Federal de 1988, que teria previsto a ação penal pública como privativa do Ministério Público, nos termos da lei. A Corte Suprema, por sua vez, julgou a ação improcedente, alegando, em síntese, que o artigo é direcionado às autoridades fiscais e não aos membros do Ministério Público, podendo este ofertar a sua denúncia independentemente da representação fiscal, desde que tenha tomado conhecimento do prévio exaurimento do procedimento administrativo fiscal por outros meios.
A jurisprudência dos tribunais superiores, todavia, foi sendo estabelecida no sentido da efetiva necessidade de que o tributo houvesse sido tido como definitivamente devido no âmbito administrativo. Foi deduzido que, antes desse momento preliminar, não existiria sequer tipicidade penal, já que, nos termos do artigo 142 do Código Tributário Nacional, a competência para a promoção do lançamento era privativa da autoridade administrativa. E se apenas a esta autoridade caberia promover o lançamento tributário, o tributo apenas poderia ser considerado devido após a finalização deste procedimento administrativo fiscal, sendo, deste modo, incabível se falar na "redução" ou "supressão" do tributo previstas no art. 1º da lei nº 8.137/90 antes deste momento. Assim, qualquer procedimento penal iniciado antes dessa fase não seria lícito, quer seja um inquérito policial, quer seja a própria ação penal. Ora, se não havia a própria tipicidade material, o inquérito policial e a ação penal iniciados seriam prematuros, por ausência de justa causa.
Dessa forma, conclui-se que, segundo a própria doutrina tributarista, exemplificada nas palavras de Ricardo Alexandre, a consumação de uma das formas dos crimes materiais contra a ordem tributária apenas ocorrerá quando a autoridade competente chegar à conclusão, por meio de um processo administrativo próprio, que o tributo era, de fato, devido. Antes disso, qualquer instrumento penal iniciado será arbitrário e constrangerá ilegalmente o acusado.
2.9 Competência
Ao se falar em competência deve-se observar quem é o sujeito passivo e conforme preceitua o artigo 78, II, A do CPP, será de competência da Justiça Federal se o sujeito passivo for Ente Federal. Se o sujeito passivo for Ente Estadual, a competência será da Justiça Estadual.
Quanto à competência surge uma peculiaridade no caso do julgamento unificado dos crimes conexos de competência Federa e Estadual. Para tal hipótese a Súmula nº 122 do STJ resolve ao enunciar que em tais casos a competência será da Justiça Federal.
2.10 Sigilo Fiscal
Sobre o sigilo fiscal, o art. 198 do Código Tributário Nacional veta a Fazenda Pública ou seus funcionários de divulgar informações a respeito da situação econômica ou financeira, negócios ou atividades relacionadas ao contribuinte.
No parágrafo único do referido artigo faz-se uma ressalva à esse preceito, no caso de requisição judicial no interesse da Justiça.
2.11 Prisão e Liberdade Provisória
Em se falando de liberdade provisória no caso de prisão em flagrante, o art. 325, § 2º, I do CPP, estabelecia ser incabível nos casos em que versavam sobre crimes contra a economia popular ou crime de sonegação fiscal. Sendo apenas admitida na hipótese de fiança arbitrada por juiz competente.
Contudo, em 2011 a Lei nº 12.403 expressamente vedou tal dispositivo, sendo pois atualmente admitida a concessão de Liberdade Provisória.
2.12 Lavagem de Dinheiro
O crime de sonegação fiscal não está inserido no rol do art. 1º da Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei nº 9.613/98), contudo admite-se o enquadramento neste rol se a conduta de sonegação for praticada por organização criminosa. Dessa forma será enquadrado no Inciso VII do referido artigo.
3. ANÁLISE DOS TRÊS PRIMEIROS ARTIGOS
Segue agora uma breve análise sobre os três primeiros artigos da lei, os quais se referem a crimes contra a ordem tributária.
Todos os cinco elemento penais contidos no artigo 1º da Lei 8.137/90 estão ligados ao que é estabelecido no caput, o qual apresenta de forma genérica os requisitos aplicáveis a todos os cinco incisos dos crimes contra ordem tributária, onde determinam as condutas incriminadoras a que faz referência.
“Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas”
Muitas vezes os crimes estabelecidos no artigo 1º são chamados de crimes de “sonegação própria”. Essa denominação se dá, pois a doutrina exige, para sua consumação na supressão ou redução de tributo, a ocorrência do resultado naturalístico, considerando todos como crimes materiais.
Na forma do art. 113 do Código Tributário Nacional e se atentando ao princípio da tipicidade fechada, o legislador, além de incluir expressamente as contribuições sociais como elementar típica alternativa, inclui também a redução ou supressão de acessórios, que devem ser entendidos como sendo as obrigações pecuniárias – e estritamente as pecuniárias – que sejam decorrentes da inobservância das obrigações acessórias.
O artigo traz, nos seus incisos, os delitos, onde neles o tributo poderá ser suprimido total ou parcialmente.
Segundo Capez, ”trata-se de crime praticado por particular contra ordem tributária, assim sujeito ativo é o contribuinte, isto é, aquele que tem a obrigação do pagamento do tributo (CTN art. 121). No caso do contribuinte ser pessoa jurídica, sujeito ativo será o diretor, gerente ou administrador que praticam dolosamente as ações defraudatórias”. Já o sujeito passivo “é o Estado, titular do interesse na correta arrecadação, mais precisamente a pessoa jurídica de direito público responsável pela arrecadação do tributo (União, Estado, Município)”.
A pena prevista para todas hipóteses é de reclusão de dois a cinco anos, e multa.
Passemos agora à análise dos cinco incisos englobados pelo art. 1º.
3.1.1 Inciso I - Omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias
“Omitir” consiste em ocultar a informação sobre a existência de fato geradora à autoridade fiscal. “Prestar” tem um caráter comissivo, ocorre com o repasse de informação errada e/ou adulterada, não condizendo com a realidade.
O dever de disponibilizar a informação é presumida pela modalidade omissiva.
Se tratando da modalidade “prestar declaração falsa”, o crime corresponde a uma falsidade ideológica por comissão com a especificidade de ter sido cometida com a intenção de suprimir ou reduzir tributo ou acessório.
A modalidade omissiva não admite tentativa, até porque se o agente efetua o pagamento integral do tributo e/ou acessório, não haverá nem mesmo tipicidade. Por outro lado, a modalidade comissiva admite tentativa desde que o meio utilizado possa ser fracionado, o que é perfeitamente admissível em tese.
3.1.2 Inciso II - Fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal
As condutas desse inciso já estão elencadas no inciso anterior. Sendo de qualquer naturalidade, a omissão de informação da autoridade fiscal e a prestação de declaração falsa insere elementos inexatos em documento ou livro exigido pela lei fiscal.
3.1.3 Inciso III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável
O inciso III trata de uma falsidade, assim como o anterior.
3.1.4 Inciso IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato
O inciso IV apresenta modalidades de falsidade ideológica, material e de uso de documento falso. O Supremo Tribunal Federal acabou por considerar também o inciso IV como sendo crime material, conforme restou expresso no enunciado nº 24 da sua Súmula Vinculante.
Concluímos, então, que as figuras do inciso IV restam incluídas nos tipos anteriormente arrolados no mesmo artigo 1º.
3.1.5 Inciso V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.
Destina-se à tutela do interesse difuso-comunitário consistente da preservação da ordem tributária.
3.1.6 Parágrafo único - A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V
Prima facie, o parágrafo único teria o condão de incriminar a conduta de o contribuinte desatender à intimação feita pela autoridade fiscal, no prazo de dez dias, acrescentando-se mais uma figura delitiva às já especificadas no inciso V (ou seja, não é condição para a ocorrência do crime do inciso V a prévia intimação fiscal, como já mencionado).
O problema é que dificilmente tal conduta criminosa será caracterizada ou comprovada na prática, porque o contribuinte teria que propiciar a supressão ou redução do tributo por meio da conduta de não atendimento da intimação do fiscal. Acontece que a conduta de sonegação consistente na ocultação da ocorrência do fato gerador normalmente já terá sido antecedente, quando da não-declaração ao Fisco, de maneira que no momento da ação fiscal, em que ocorre a intimação, a conduta do contribuinte não será lídima a ensejar supressão/redução de tributo, que já teriam acontecido anteriormente.
Os artigos 2º e 3º da lei que versa sobre os crimes contra a ordem tributária tratam sobre os delitos da chamada “Sonegação Fiscal”, ou seja, crimes praticados contra o erário público, respectivamente, por particular e por funcionário público.
3.2.1 O art. 2º e incisos I a V
De acordo com o caput do art. 2º, os crimes elencados em seus incisos são de mesma natureza do previsto no art. 1º da mesma lei. Segundo Capez (2012), há na doutrina e na jurisprudência quem se posicione no sentido de auferir que o que o legislador quis dizer com “constitui crime de mesma natureza”, simplesmente porque se trataria de crime contra a ordem tributária (MACHADO, 2010), desta forma, o crime seria formal, ou de mera conduta, necessitando apenas da realização do comportamento, prescindindo do resultado naturalístico para sua efetivação. Se é possível a concretização da conduta, e, com isso, o efetivo resultado naturalístico das condutas de suprimir ou reduzir o pagamento do tributo, inexiste, portanto, o crime de mera conduta. Concordam Brutti (2006), Capez (2012). Entendemos tratar-se de crime de mera conduta, conforme o entendimento de Hugo de Brito Machado, vez que, como será visto adiante, muitas das condutas descritas no artigo em análise têm como característica este pormenor.
O foro competente para o processamento e julgamento da ação dependerá do polo passivo. Se for ente federal, a competência será da Justiça Federal ( art. 109, IV da CF[1]), se, no entanto, for ente estadual ou municipal, a competência será da Justiça Estadual, de acordo com a Súmula 122 do STJ[2](HOTT, S/D). É crime comum, posto que poderá ser praticado por particular contra o erário público, desta feita o sujeito ativo será qualquer pessoa pratique qualquer das condutas previstas nos incisos I a V na qualidade de contribuinte. Brutti (2006) é ainda mais preciso, quando afirma que o sujeito ativo é o contribuinte. Todavia, também poderão praticar os crimes supracitados o contador, o advogado, entre outros. Nas hipóteses previstas nos incisos III e V do artigo 2º, a lei excepciona que qualquer do povo poderá figurar como sujeito ativo (HOTT, S/D). O sujeito passivo, por tratar-se de crime contra a ordem tributária, será sempre o erário público. O elemento subjetivo sempre será o dolo, pois a Lei 8.137/90 não consagrou a modalidade culposa em nenhum dos crimes previstos na Seção I da lei (MACHADO, 2010; ZANONI, 2001), os quais agora em análise.
A Ação Penal é pública incondicionada nos crimes previstos nos artigos 2.º e 3.º. Em decorrência Lei n. 9.430/96, mais precisamente em seu art. 83, vedou‐se à autoridade fazendária a remessa de notícia de crime, ou representação, ao Ministério Público, antes do término do procedimento administrativo fazendário. No entanto, por óbvio, se o Ministério Público dispuser de elementos, para dar início à ação penal, deverá fazê‐lo (BRUTTI, 2006). Nem sempre é de fácil identificação
No tocante à pena, ela é de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa. De importante valia é ressaltar a incidência da Súmula 171 do STJ[3], que impede a substituição da substituição da pena privativa de liberdade por multa, quando ambas estiverem previstas em lei especial (CAPEZ, 2012). Ademais, trata-se de infração de menor potencial ofensivo, estando sujeita às disposições da Lei n. 9.099/95. É cabível a suspensão condicional do processo nos termos do art. 89 da Lei (BRUTTI, 2006).
“I ‐ fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir‐se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo”.
Esta previsão legal aponta três núcleos penais: fazer declaração falsa, omitir declaração e empregar fraude para eximir-se do pagamento de tributo. De acordo com o Professor Fernando Capez, é necessário o elemento subjetivo do tipo em todas as condutas do inciso, qual ele, a finalidade especial de eximir-se total ou parcialmente do pagamento do tributo; não sendo necessário realizar o resultado pretendido, desta forma consuma-se com a prestação da declaração falsa, com a omissão da declaração, ou com o emprego de fraude (CAPEZ, 2012). O inciso I do art. º dispensa a necessidade de efetiva comprovação da efetiva supressão ou redução do pagamento do tributo. Conforme o referido inciso, o emprego de qualquer fraude contra o fisco, mesmo que diferente dos outros núcleos penais nele previstos, já implica crime, ainda que concretamente não chegue a acarretar sonegação de tributo. Portanto, conclui-se que se trata de crime em que a mera conduta é suficiente para a caracterização do delito, vez que, como já elucidado, dispensa prejuízo concreto para o erário público, pois exige-se apenas que o objetivo do agente tenha sido o de lesá-lo (_______, 2012; MACHADO, 2010).
“II ‐ deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”.
Este inciso assemelha-se ainda mais ao art. 1º da lei que prevê os crimes contra a ordem tributária, isso se dá em razão de que o disposto no art. 2º, I é literal ao aduzir que comete crime quem deixar de recolher tributo ou contribuição social, previsão também presente no art. 1º. Assim, esta conduta descrita no sobredito inciso, somente será crime se o agente visar a supressão ou redução de tributo ou contribuição social ou qualquer acessório, conforme dispõe o artigo 1º da Lei em comento (ZANONI, 2001). Trata-se de crime omissivo próprio, que a despeito desta característica, pressupõe uma ação anterior, qual ela, a de descontar ou cobrar o valor do tributo, pois somente deixará o sujeito passivo da obrigação tributária de recolher o valor do tributo aos cofres públicos, se anteriormente, houve o desconto ou cobrança desse valor (CAPEZ, 2012; ZANONI, 2001).
O sujeito ativo do crime, aquele que pratica a conduta descrita no tipo penal, é aquele que está obrigado a recolher o valor de tributo, descontado ou cobrado, aos cofres públicos. Assim, o sujeito ativo do delito em comento será o sujeito passivo da obrigação tributária. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, a vontade livre e consciente de coisa alheia, móvel da qual tem posse ou detenção (MACHADO, 2010). O momento consumativo do delito em questão consiste no fato de deixar de recolher o valor de tributo arrecadado aos cofres públicos; o crime consuma-se com a omissão do agente em entregar à Fazenda Pública o valor de tributo devido, na qualidade de sujeito passivo da obrigação tributária. No caso de empregador que não recolhe a contribuição social devida à Previdência Social descontada do empregado, incide no crime previsto no art. 168-A do CP[4] (CAPEZ, 2012).
“III ‐ exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal”.
O tipo penal abrange instituições financeiras públicas ou privadas que arrecadem parcelas correspondentes à incentivos fiscais, bem como aqueles intermediários que pratique, qualquer das condutas descritas no tipo (HOTT, S/D). De acordo com Capez (2012), tais crimes serão praticados pelos dirigentes, empregados, intermediários de instituições financeiras responsáveis pela arrecadação e posterior aplicação das somas advindas de redução de tributos a título de incentivos fiscais. Os núcleos do tipo penal (exigir, pagar ou receber) objetivam as parcelas dedutíveis ou deduzidas de imposto ou contribuição social a título de incentivo fiscal. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que se efetiva no fim de beneficiar a si ou a terceiro; consuma-se com a mera exigência, pagamento ou recebimento (BRUTTI, 2006). A tentativa é admissível, desde que a conduta seja plurissubsistente. Convém notar que o crime em tela se assemelha aos delitos de concussão (CP, art. 316) e corrupção passiva (CP, art. 317) (CAPEZ, 2012).
3.2.5 Inciso IV da Lei 8.137/90
“IV ‐ deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento”.
Trata-se de tipo penal que visa a punir o beneficiário do incentivo fiscal que o emprega irregularmente ou não o aplica. O sujeito ativo é o beneficiário do incentivo fiscal, o sujeito passivo é o Estado e secundariamente, a entidade beneficiária do incentivo fiscal concedido. É norma penal em branco, pois cabe à lei instituidora do incentivo fiscal disciplinar a aplicação do valor do benefício (CAPEZ, 2012). O tipo penal exige o dolo de praticar uma das condutas típicas, sem nenhuma finalidade especial. Consuma-se com o decurso do prazo sem a aplicação do incentivo; ou com a aplicação irregular do incentivo ou parcelas de imposto liberadas por entidade de desenvolvimento (HOTT, S/D).
3.2.6 Inciso V da Lei 8.137/90
“V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa aquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública”.
O objeto jurídico tutela é a proteção das informações contábeis, prestadas ao Fisco e, ainda a sua integridade (HOTT, S/D). Para tanto, punível é a conduta daquele que faz uso ou difunde programa de processamento de dados que possibilite a manutenção paralela de informações distintas da fornecida ao fisco (CAPEZ, 2012). O sujeito ativo é qualquer pessoa e também o terceiro que se utiliza ou divulga programa de processamento de dados, de forma indevida. O sujeito passivo é a entidade de direito público lesada.
A conduta se consubstancia nos núcleos “utilizar” e “divulgar” programa de processamento de dados. Neste tipo penal, o sujeito faz inserir nos registros contábeis, através de processamento de dados, informações diversas daquelas que deveria prestar ao Fisco, com o intuito de lesá-lo, obtendo, com isso, a suspensão ou redução do tributo. Segundo Hott (S/D), esse tipo penal assemelha-se ao delito de falsidade ideológica, previsto no art. 299, do Código Penal Brasileiro. O elemento subjetivo é o dolo observado na finalidade de sonegação fiscal. Trata-se de crime formal que admite tentativa quando fracionável o iter criminis. Consuma-se o crime com a mera utilização ou divulgação, não se exigindo supressão ou redução do tributo.
3.2.7 Análise do Art. 3º e seus Incisos.
A principal característica do artigo 3º da Lei 8.137/90 é que sua incidência recai sobre o funcionário público. Trata-se, portanto, de crime funcional e, portanto, próprio, posto que somente o funcionário público, no uso de suas atribuições ou em razão delas poderá praticá-lo, para tanto, utiliza-se a definição expressa no art. 327 do Código Penal.
Conforme ensina Hott (S/D), os crimes previstos no art. 3º da lei em análise não esgotam o rol de crimes praticados por funcionários públicos contra a administração pública. Qualquer conduta fática cometida pelo funcionário público, na órbita dos crimes fazendários, ou contra a administração pública em geral será punida pela Lei 8137/90, no caso de serem nela previstos (princípio da especialidade), caso contrário, será pelos crimes elencados no Código Penal Brasileiro.
Capez (2012) acrescenta que antes do advento da Lei n. 8.137/90, essas figuras típicas eram enquadradas no Código Penal, tais como o extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento (CP, art. 314), a concussão (CP, art. 316), a corrupção passiva (CP, art. 317) e a advocacia administrativa (CP, art. 321). Por derradeiro, é por expressa previsão legal, que o funcionário público que vier a praticar o crime de corrupção passiva estará sujeito as penas do artigo 3.º inciso II da Lei 8137/90. Por se tratar de crime funcional, no caso de a infração ser afiançável, é cabível a notificação do funcionário, antes do recebimento da denúncia, para oferecer a resposta preliminar no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 514, do Código de Processo Penal.
O sujeito ativo será sempre funcionário público, e o sujeito passivo, será sempre a entidade de direito público arrecadadora do tributo (HOTT, S/D). Na hipótese do inciso I o contribuinte prejudicado será o sujeito passivo secundário.
“I - extraviar livro oficial, processo fiscal ou qualquer documento, de que tenha a guarda em razão da função; sonegá‐lo, ou inutilizá‐lo, total ou parcialmente, acarretando pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social”.
Este ilícito penal, muito semelhante ao disposto no art. 314, do CP, trata do extravio. O tipo é alternativo, podendo caracterizar-se mediante extravio, sonegação ou inutilização (total ou parcial) de livro, processo ou qualquer documento fiscal. A negligência não implica em sanção penal, no entanto não exime o funcionário público das sanções administrativas que lhe forem pertinentes. O objeto material é o livro oficial, processo fiscal ou documento relativo a tributo sobre o qual o funcionário público tem o dever de custódia em razão da função (CAPEZ, 2012). Uma vez que não tenha o dever de guarda, ou seja, no caso de ser o agente um particular, o crime será de Sonegação de Contribuição Previdenciária, consagrado no art. 337 do Código Penal.
Ainda de acordo com Capez, cuida-se de crime material, vez que o tipo penal exige como consequência de qualquer das condutas, o resultado naturalístico “pagamento indevido ou inexato de tributo”; a tentativa é possível quando, embora cometida qualquer das condutas, ela não acarretar dano ao erário. A pena é de reclusão, de 3 a 8 anos, e a multa.
“Exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, em razão da função, mesmo que fora dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem para
deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los indevidamente”.
Trata-se dos crimes de concussão e corrupção passiva, contudo praticados com a finalidade de deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los indevidamente. Assim, cuida-se de um tipo especial em relação aos arts. 316 e 317 do Código Penal.
A diferença entre os dois tipos penais reside no fato de que no caso da corrupção passiva, o agente solicita vantagem indevida, desta forma, o núcleo do tipo reside no verbo “solicitar”, já na concussão, o agente exige vantagem indevida para si ou para outrem, impondo à vítima uma obrigação, satisfeita em razão do temor imposto pelo funcionário público, em razão de sua função.
Assim, ocorre o crime contra a ordem tributária quando o funcionário público, em razão de usar a qualidade de agente fiscal, exige a vantagem indevida para deixar de lançar auto de infração por débito tributário e cobrar consequente multa (CAPEZ, 2012). O tipo penal poderá ocorrer mesmo que o funcionário não esteja no efetivo exercício, posto que o funcionário poderá cometer este crime, isto é, solicitar ou exigir a vantagem indevida no uso de suas atribuições, ou em razão delas. É crime formal que se consuma com a mera exigência, solicitação ou recebimento; não cabe tentativa. A pena é de reclusão de 3 a 8 anos e multa, sendo inadmissível a proposta de suspensão condicional do processo.
“Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração Fazendária valendo-se da qualidade de funcionário público”.
Trata-se de tipo penal especial, posto que é um tipo de Advocacia Administrativa e que, por essa razão, prevalece sobre o crime genérico previsto no art. 321 do CP. É admissível coautoria ou participação de particulares em face do disposto no art. 30 do CP. Consuma-se o crime no momento em que o funcionário formula a sua pretensão perante a repartição fazendária, sendo inadmissível a tentativa. O elemento subjetivo é o dolo, consubstanciado na vontade de praticar a conduta típica. A pena é de reclusão de um a 4 anos e multa, admitindo-se a suspensão condicional do processo.
4 CONCURSO DE CRIMES
Em se tratando dos crimes contidos no art. 1º e 2º da Lei 8.130-1990, muitos são aqueles em que o elemento constitutivo é o falso documental, seja ele ideológico material ou uso de documento falso.
Ou seja, a falsidade é empregada como meio necessário para a sonegação fiscal não poderá ser apenada autonomamente. Em outras palavras, seria o caso de "bis in idem".
Dessa forma, a Súmula 17 do STJ vem para ratificar tal entendimento quando diz que nos casos sem potencialidade lesiva se exaure o falso pelo estelionato. Todavia, questiona-se então a hipótese de alta potencialidade lesiva do falso, entendendo a Corte que em tal hipótese não haverá absorvição por parte do estelionato ou do crime de sonegação.
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BRASIL, Planalto Nacional. Constituição Federal. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituição/ConstituicaoCompilado.htm > Acesso em nov 2014.
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BRUTTI, Roger Spode. Crimes contra a ordem tributária. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, IX, n. 35, dez 2006. Disponível em:. Acesso em nov 2014.
CALHAU, Lélio Braga. A desnecessidade do esgotamento da esfera administrativa como condição de procedibilidade da ação penal nos crimes contra a ordem tributária. Disponível em: < http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/11930-11930-1-PB.htm > Acesso em nov de 2014.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Legislação Penal Especial. Vol. 4. 7 ed. São Paulo: Saraiva. 2012.
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