terça-feira, 3 de outubro de 2017

DISPOSIÇOES PRELIMINARES ( 3 )

financiamento ou outra característica que possua. Enfatizamos que o Estado não pode tratar de modo diferenciado as instituições religiosas, impondo obstáculos ou concedendo privilégios a um grupo em detrimento de outro. A defesa da Liberdade Religiosa no Estado brasileiro reveste-se de extrema importância por vivermos em um Estado laico. A laicidade ocorre quando há separação entre igreja e Estado. Isso significa que Estado laico é aquele em que não há uma religião ou entidade religiosa oficial, e onde se garante às organizações religiosas uma não interferência do Estado em sua criação e funcionamento. Neste sentido, é de se ressaltar que, ao contrário do que advogam certos setores antidemocráticos da nossa sociedade, Estado Laico não é o mesmo que Estado Ateu ou Estado sem Religião. Estado Laico, por assim ser, é aquele em que há irrestrita Liberdade de se professar, ou não, uma fé, crença ou religião, sem intromissões de quaisquer naturezas. Pois bem. O presente Projeto de Lei foi elaborado contendo cinco capítulos. O Capítulo I trata das Disposições Preliminares, Princípios e Objetivos, estabelecendo conceitos, limitações, e a abrangência da Lei, denominada doravante de Estatuto Jurídico da Liberdade Religiosa. O Capítulo II versa sobre os Direitos Individuais da Liberdade Religiosa, regulamentando aspectos ligados à esfera da intimidade, da privacidade e os limites da liberdade em face de outrem. Esse capítulo se encontra subdividido em três seções. A primeira delas, ao tratar das disposições gerais, apresenta extensões e limitações ao exercício individual da Liberdade Religiosa e exemplos de liberdades civis fundamentais decorrentes do direito de Liberdade Religiosa, por acreditarmos que esta não consiste em um único direito, mas num complexo jurídico de direitos. A segunda seção regulamenta a liberdade religiosa das crianças e adolescentes, em consonância com a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente. A seção III, por sua vez, trata da objeção de consciência, seu conceito, garantias e limitações, na forma dos art. 5º, inciso VII, 15 e 143 da Constituição. O Capítulo III dispõe sobre os Direitos Coletivos da Liberdade Religiosa, regulamentando as implicações relevantes junto às liberdades e aos direitos públicos, envolvendo o aspecto social do direito e a limitação jurídica estatal. A seção I – disposições gerais – confere garantias e 20 direitos às igrejas e comunidades religiosas e impõe limitações ao Estado em relação à criação e funcionamento das organizações religiosas. O Estatuto, nesse capítulo, ainda traz uma regulamentação especial no tocante à Liberdade Religiosa das Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais – Seção II –, tendo em vista serem estes, atualmente, um dos segmentos sociais onde mais se nota o desrespeito ao direito humano fundamental de liberdade religiosa. No caso específico das populações indígenas o que se vê por parte do Poder Público, especialmente do órgão de proteção, a FUNAI – Fundação Nacional do Índio – é o flagrante desrespeito à liberdade religiosa dos indígenas e o descumprimento das determinações da Convenção nº 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho – aprovada pelo Congresso Nacional brasileiro em 25 de agosto de 1993, e entrando em vigor através do Decreto Legislativo n. 143, de 20 de junho de 2002 –, assim como, a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 13 de setembro de 2007, tendo o Brasil como país signatário e os diversos posicionamentos da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA – Organização dos Estados Americanos, todos no sentido da prevalência do princípio da autodeterminação dos povos, inclusive, da capacidade dos povos indígenas de celebrarem tratados internacionais e terem sua própria ordem jurídica, em coexistência com a dos Estados Nacionais onde seus territórios estejam encravados. Tudo isso para garantir que os povos indígenas tenham seus direitos assegurados, como é o caso do Direito de Liberdade Religiosa regulado aqui pelo presente Projeto de Lei. O tema do Capítulo IV é a Laicidade do Estado, que, segundo a Declaração Universal da Laicidade no Século XXI1 , constitui um elemento chave da vida democrática. O capítulo traz a definição e implicações da laicidade estatal no contexto brasileiro, inclusive afirmando situações não atentatórias à laicidade estatal. É de se destacar neste item que a laicidade estatal é um patrimônio constitucional nosso, mas esta não significa em hipótese nenhuma a restrição das diversas expressões culturais e religiosas no nosso país, como fica estabelecido nos termos do presente Estatuto. 1 Declaração apresentada pelos professores Jean Baubérot (França), Micheline Milot (Canadá) e Roberto Blancarte (México) no Senado Francês, em 9 de dezembro de 2005, por ocasião das comemorações do centenário da separação Estado-Igrejas na França, tendo sido firmada por 250 acadêmicos de 30 países. 21 O Capítulo V dispõe sobre os Ministros de Confissão Religiosa, delimitando quais indivíduos encontram-se nessa posição, conferindo direitos a esse grupo de pessoas e enfatizando questões ligadas à objeção de consciência desses indivíduos. O Capítulo VI do Estatuto trata das Violações à Liberdade Religiosa, com o objetivo de combater e prevenir casos de violação dos direitos humanos e das liberdades civis fundamentais proclamados na Constituição Federal. O capítulo aponta os atos considerados como discriminatórios e de intolerância contra a liberdade religiosa, a forma de apuração desses atos e as penalidades aplicáveis aos que os praticarem. O objetivo é fazer com que, por exemplo, o Poder Público – atualmente um dos grandes responsáveis por violações e danos na área da Liberdade Religiosa – seja, na verdade, como estabelece a Constituição Federal, o grande promotor e protetor dos cidadãos e cidadãs brasileiros no que concerne ao exercício das suas predileções e crenças religiosas ou não. Como o jurista, Prof. Uziel Santana2 (presidente da ANAJURE – Associação Nacional de Juristas Evangélicos e professor da UFS – Universidade Federal de Sergipe) tem defendido, no Brasil, apesar de não haver violência real há o que eles chamam de “violência simbólica”, vale dizer, no Brasil atual temos vivenciado dias em que a perseguição religiosa ocorre na sua forma simbólica, isto é, através do discurso de certos segmentos sociais, da propagação de certas ideologias secularistas – notadamente dirigidas contra o Cristianismo, ainda que não circunscrita a apenas esta religião. Como destaca o Prof. Santana em seus escritos, precisamos acabar no nosso país com o discurso de ódio proferido contra os religiosos e mitigar toda forma discriminação e estereótipos propalados pela própria mídia escrita e televisiva. Assim também, no campo desta violência simbólica, estamos a criar mecanismos fiscalizadores e punitivos dos próprios agentes e servidores do Estado, quando, no exercício das suas funções, vão além dos limites constitucionais e legais e passam a ser verdadeiros cerceadores da Liberdade Religiosa neste país Destarte, através do presente Projeto de Lei – Estatuto Jurídico da Liberdade Religiosa – o Estado Brasileiro se compromete a defender a Liberdade religiosa em todas as suas formas de expressão, 2 SANTANA, Uziel e CARVALHO, Felipe Augusto Lopes. “Religious Freedom in Latin America”. In: Freedom of Belief and Christian Mission, Regnum Edinburgh Centenary Series, 2015. E: SANTANA, Uziel e CARVALHO, Felipe Augusto Lopes. Religious Freedom in Brazil: Reflections on Symbolic Violence. Conference at “IV Oxbridge Conference on Brazilian Studies” in Hughes Hall, University of Cambridge, May 2nd, 2015. 22 individuais e coletivas, elevando-a ao valor previsto nas Declarações e Tratados Internacionais, assim como na nossa própria Constituição Federal, como um Direito Humano Fundamental, tratando com igualdade e respeito todos os grupos religiosos, e servindo de instrumento legal para prevenir e combater todas as formas e manifestações de intolerância e discriminação por motivos de religião ou de convicções. Por isso, temos a plena certeza de que podemos contar com o apoio de todos os Nobres Pares pela aprovação deste Projeto. Sala das Sessões, em de de 2015. Deputado LEONARDO QUINTÃO

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